rELATO DE EXPERIÊNCIA

Prática ambulatorial de enfermagem na prevenção do câncer de mama: relato de experiência

Outpatient nursing practice in the prevention of breast cancer: experience report

Práctica de enfermería ambulatoria en la prevención del cáncer de mama: relato de experiencia

Ribeiro, Brenda Torquato[1]; Ferraz, Leidiléia Mesquita[2]; Bittencourt, Jaqueline Ferreira Ventura[3]; Carvalho, Simone Meira[4]

RESUMO

Objetivo: compartilhar a experiência vivenciada na elaboração e implementação de um ambulatório de enfermagem no enfrentamento do câncer de mama, colaborando com a práxis profissional. Método: relato de experiência vivenciada no período de julho de 2017 a julho de 2018, prestando assistência a 21 mulheres na faixa etária de 23 a 68 anos. Resultados: os achados foram agrupados reunindo as principais características da experiência aos elementos-chave, sendo divididas em quatro categorias: fatores positivos, fatores negativos, diferenciais e potencialidades. Conclusão: foi possível perceber a importância em se destacar o potencial do(a) enfermeiro(a) para transitar nos distintos contextos da profissão, trazendo maior visibilidade para a sua atuação em ambulatórios.

Descritores: Assistência ambulatorial; Enfermagem no consultório; Neoplasias da mama

ABSTRACT

Objective: to share the experience lived in the design and implementation of a nursing outpatient clinic to face breast cancer, collaborating with professional praxis. Method: this is an experience report, experienced from July 2017 to July 2018, providing assistance to 21 women aged 23 to 68 years. Results: the findings were grouped bringing together the main characteristics of the experience with key elements, being divided into four categories: positive factors, negative factors, differentials and potentialities. Conclusion: it was possible to perceive the importance of highlighting the potential of nurses to move through the different contexts of the profession, bringing greater visibility to their work in outpatient clinics.

Descriptors: Ambulatory care; Office nursing; Breast neoplasms

RESUMEN

Objetivo: compartir la experiencia vivida en el diseño e implementación de un ambulatorio de enfermería para enfrentar el cáncer de mama, colaborando con la praxis profesional. Método: se trata de un informe de experiencia, vivido de julio de 2017 a julio de 2018, en lo cual se prestó asistencia a 21 mujeres de 23 a 68 años. Resultados: los hallazgos se agruparon reuniendo las principales características de la experiencia con elementos clave, dividiéndose en cuatro categorías: factores positivos, factores negativos, diferenciales y potencialidades. Conclusión: se pudo percibir la importancia de resaltar el potencial de las enfermeras para transitar por los diferentes contextos de la profesión, dando mayor visibilidad a su trabajo en clínicas ambulatorias.

Descriptores: Atención ambulatoria; Enfermería de consulta; Neoplasias de la mama

INTRODUÇÃO

O câncer de mama, é a principal causa de morte por câncer em mulheres.1 Em virtude da incidência é considerado o segundo mais frequente entre os cânceres, totalizando cerca de 11,6% de casos e é, também, um dos mais temidos devido medo de recidivas da doença e por ocasionar um grande impacto na sexualidade e alterações na imagem corporal.1-2 Segundo o Estudo Global da Carga de Doenças, projeto científico que auxilia na estimativa e na análise da carga de doenças globais, em 2017 o câncer de mama foi a principal causa de morte feminina dentre as mulheres que portavam algum tipo de câncer, apresentando-se, ainda, como um grande desafio para a saúde pública.3

O diagnóstico tardio da neoplasia mamária aumenta a morbidade correlacionada ao tratamento, afetando a qualidade de vida e elevando o número de óbitos de mulheres, de forma cada vez mais precoce.4 No Brasil, para o câncer de mama, foram estimados 66.280 novos casos da doença para cada ano do triênio 2020-2022, apresentando uma taxa de incidência de 61,61 novos casos ou para cada 100 mil mulheres.5

Com o objetivo de modificar essa alta incidência, o controle do câncer de mama tem sido uma das prioridades na agenda da política nacional de saúde do Brasil. O Ministério da Saúde (MS) vem implementando estratégias de rastreamento e diagnóstico precoce para a identificação da doença em estágios iniciais, possibilitado um bom prognóstico, tratamento de qualidade e proporcionando uma assistência integral em todas as fases da linha de cuidado.6

A estratégia de diagnóstico precoce da neoplasia mamária mais aceita mundialmente se dá através de três principais pontos: população atenta aos sinais e sintomas sugestivos; profissionais de saúde qualificados para avaliar os casos indicativos da doença; e a rede de atenção à saúde preparada para garantir o atendimento necessário na confirmação diagnóstica. O rastreamento, esse por sua vez, se realizado com cobertura total às mulheres na faixa etária preconizada pelo MS, possibilita a descoberta da doença ainda na fase inicial por meio da realização da mamografia bienal para as mulheres na faixa etária de 50 a 69 anos, identificando a doença em sua fase assintomática.7

Considerando a relevância de fortalecer as três principais ações da detecção precoce do câncer de mama, foi criado um ambulatório de enfermagem no Hospital Universitário (HU) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), voltado especialmente para esta doença. As consultas, além de importante instrumento para diminuir as taxas de morbimortalidade do câncer mamário no país, visaram diminuir as lacunas da formação acadêmica e buscaram também ampliar a visão de uma assistência à saúde mais humanizada. 

Esse ambulatório de enfermagem é uma das ações do Projeto de Extensão Universitária “DE PEITO ABERTO: programa de prevenção e acompanhamento integrado no câncer de mama”, iniciado em 2001 com o objetivo de estimular a detecção precoce do câncer mamário e acompanhar a mulher acometida em todas as suas fases. O projeto atuou de forma interdisciplinar, reunindo acadêmicos e profissionais de diversas áreas da saúde, como medicina, enfermagem, fisioterapia, psicologia e nutrição. O objetivo é, portanto, proporcionar as usuárias do serviço de saúde do HU-UFJF atendimento contínuo, integral e humanizado na assistência ao câncer de mama. 

A respeito do câncer de mama, a enfermagem dispõe de ampla capacidade no manejo desta doença. O enfermeiro exerce papel essencial na detecção precoce, uma vez que mantém contato direto com a população, realizando rotineiramente consultas as mulheres. Para isso, é preciso que o profissional da área da saúde que lida com projetos voltados para a prevenção do câncer de mama tenha acesso à educação permanente, a fim de que ele possua treinamento para orientar sobre a prevenção da doença, exercendo o seu papel de educador em saúde, e também esteja preparado para atuar no combate a neoplasia mamária, detectando-o precocemente.8-9

O enfermeiro além de realizar educação permanente, precisa também estar familiarizado com a Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE). A SAE é uma metodologia científica que possibilita o profissional enfermeiro a aplicar seus conhecimentos técnico-científicos e humanos na assistência, oferecendo respaldo científico, direcionamento e segurança para as atividades realizadas.10 A sua utilização propicia uma atuação profissional mais crítica e reflexiva, favorece a organização do trabalho e aumenta a qualidade dos serviços prestados.11 

Portanto, esse relato de experiência teve como foco promover tanto o tema, quanto o fortalecimento do papel da enfermagem no enfrentamento do câncer de mama. O objetivo foi compartilhar a experiência vivenciada na elaboração e implementação do ambulatório de enfermagem, colaborando com a práxis profissional. Ainda, traz elementos importantes para a atuação profissional e visa incentivar outros acadêmicos e profissionais de saúde que no Brasil existem a explorar mais o câncer de mama.

Também, considerando a relevância do tema, o estudo enfatiza a descrição da prática ambulatorial vivenciada, desde a construção dos instrumentos necessários para a realização das consultas de enfermagem até os atendimentos prestados, refletindo sobre sua implicação para a formação acadêmica bem como sobre as dificuldades e potencialidades encontradas, servindo de subsídio para o ensino e a prática. O intuito, portanto, é socializar as experiências bem-sucedidas e colaborar com a práxis profissional da enfermagem. 

MÉTODO

Trata-se de um relato de experiência sobre a elaboração e a implementação de um ambulatório de enfermagem em um hospital universitário do estado de Minas Gerais. Com vistas a atender os objetivos propostos, o estudo utilizou o método qualitativo de pesquisa, visando responder questões particulares que não podem ser quantificadas nem reduzidas a variáveis, trabalhando, por exemplo, os significados, as aspirações, as crenças e as atitudes.12

As atividades do ambulatório iniciaram em julho de 2017, com o planejamento, organização e divulgação de seu funcionamento. A fim de nortear os atendimentos, foram criados dois instrumentos: o roteiro para o histórico de enfermagem e o roteiro para os diagnósticos de enfermagem. Essa fase inicial, em que foram desenvolvidos os instrumentos e providenciado os materiais necessários para as consultas, durou três meses. Esse tempo também serviu para que a equipe se aprofundasse na temática, realizando diversas pesquisas a respeito do câncer de mama.

Os atendimentos tiveram início em outubro de 2017 e se encerraram em julho de 2018, com pausa no período das férias acadêmicas. Por meio das consultas de enfermagem, 21 mulheres com idades de 23 a 68 anos foram atendidas pelas discentes do projeto e supervisionadas pela coordenadora. As consultas duravam, em média, uma hora e se deram às quartas-feiras no horário das 13h às 16h, em um consultório do setor ambulatorial do Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora/Unidade Dom Bosco.  O público-alvo eram mulheres de qualquer faixa etária que apresentassem algum sinal ou sintoma do câncer de mama e mulheres assintomáticas na faixa etária de 50 a 69 anos, idade preconizada pelo Ministério da Saúde para a realização do rastreamento mamográfico.7

Os atendimentos eram realizados sob agendamento, não sendo necessário encaminhamento prévio. Encerradas as consultas, eram realizadas salas de espera no hall do Hospital Universitário, no qual os pacientes aguardavam atendimento. A intenção, além de promover a educação em saúde sobre o câncer de mama, era divulgar o funcionamento do ambulatório e convidar as mulheres interessadas a participarem.

Conforme preconizado pelo Conselho Federal de Enfermagem (COFEN), através da Resolução n° 358/2009, as consultas realizadas foram sistematizadas implantando-se Processo de Enfermagem (PE) e seguiram os seus passos interligados: histórico de enfermagem, diagnósticos de enfermagem, planejamento de enfermagem, implementação, e por último, avaliação de enfermagem.13

O PE é um instrumento metodológico que orienta o cuidado profissional, valorizando e fortalecendo a profissão por adotar um cuidado baseado em evidência, que norteia o raciocínio clínico e a tomada de decisão diagnóstica e de intervenções. Ele possibilita um atendimento integral, de forma a acolher as queixas e buscar o histórico, fortalecendo o vínculo profissional/paciente.14

A respeito da dinâmica das consultas, inicialmente era realizado o histórico de enfermagem, momento em que são acolhidas as queixas e feita a anamnese e o exame físico, visando identificar problemas e necessidades. Durante a realização do exame físico, a mulher atendida era orientada quanto à realização da autopalpação das mamas. Após a coleta de todas as informações, eram definidos os diagnósticos de enfermagem e solicitados os exames necessários para prosseguir a investigação clínica, conseguindo também referenciar essas mulheres para os serviços especializados. Seguinte a isso, eram estabelecidas as prioridades para minimizar ou corrigir problemas encontrados, sendo realizadas diversas orientações para que as mulheres praticassem o autocuidado, estimulando-as a todo o momento quanto à adoção de hábitos saudáveis de vida.

Com vistas a responder ao problema e aos objetivos do estudo, em que foi proposto descrever e discutir a prática ambulatorial, bem como refletir sobre as dificuldades e as potencialidades encontradas, se fez importante ponderar a respeito da experiência obtida no ambulatório de enfermagem. Ao analisar essa experiência, os resultados foram organizados e agrupados aliando as principais características a elementos-chave, sendo divididos em quatro classes: fatores positivos, fatores negativos, diferenciais e potencialidades.

De acordo com a resolução n°150/2016 do Conselho Nacional de Saúde, em seu art. 1°, parágrafo único e inciso VII, por se tratar de um relato de experiência, que descreve unicamente a visão dos autores, dispensa apreciação ética pelo sistema CEP/Conep.15 Ainda assim, reafirmamos o compromisso ético de todos os autores responsáveis.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados do relato de experiência evidenciaram a importância de transformar a vivência em um material que servisse de subsídio para a prática profissional da enfermagem, categorizando os principais achados do estudo.

Fatores positivos

As consultas de enfermagem, previstas e autorizadas em legislação, estão permitidas desde a publicação da Resolução n° 568/2018 do Conselho Federal de Enfermagem (COFEN),16 que normatiza o funcionamento de clínicas e consultórios de enfermagem. Bem como, o Parecer n° 009/2014 emitido pelo Conselho Regional de Enfermagem (COREN) da Bahia, que versa sobre a abertura de consultórios de enfermagem e destaca o enfermeiro como profissional capacitado e treinado para ter um olhar holístico sobre o indivíduo, apontando o alto índice de resolutividade dos problemas de saúde encontrados.17

As consultas de enfermagem são importantes para o desenvolvimento de uma prática clínica pautada na integralidade do cuidado baseada em evidência. O ambulatório oportunizou aos discentes, supervisionados pela professora, o exercício dessa prática clínica através dos atendimentos, além de proporcionar a superação do modelo assistencial médico-centrado.9

Ressalta-se também a oportunidade de exercício da aplicação da SAE no processo de trabalho, visto que ela é um instrumento fundamental, pois aumenta a capacidade de percepção do enfermeiro para a detecção de problemas e permite a criação de um plano de cuidados, dando maior autonomia e segurança para o profissional.10

Tendo como foco a prevenção e a detecção precoce do câncer de mama, as consultas se mostraram essenciais, pois muito além de exames clínicos e solicitação de mamografias, foi possível observar o papel educativo significativo desempenhado pelo enfermeiro. A educação em saúde, exercitada durante as salas de espera e exercitada também durante as consultas, com uma abordagem singular, estreitou o vínculo com o paciente. Ainda, esse papel educativo é fundamental para a redução dos fatores de risco modificáveis do câncer de mama, levando às mulheres informações quanto a autopalpação das mamas e sinais de alerta sobre a doença.18

A vivência do ambulatório de enfermagem gerou pesquisas sobre a temática, o que incentivou sua aplicação do conhecimento na prática, permitindo o desenvolvimento de uma formação técnico-científica com qualidade, além de possibilitar o aprimoramento da capacidade de diagnosticar e solucionar problemas de saúde. Ainda, proporcionou maior habilidade de comunicação, de tomada de decisões e de trabalho em equipe.

Por meio da prática ambulatorial experienciada foi possível observar a autonomia da enfermagem em suas consultas e, ainda, perceber também o potencial do enfermeiro que transita em diversas frentes, permitindo que a sua atuação em ambulatórios ganhe maior visibilidade.

Fatores negativos

Ao experienciar a convivência no ambulatório, percebeu-se alguns fatores negativos durante a sua implantação e funcionamento que merecem ser problematizados a fim de que sejam amenizados ou solucionados.

Um dos problemas centrais encontrados na realização do ambulatório de enfermagem foi o baixo número de atendimentos realizados, isso se comparado ao fluxo dos demais ambulatórios do mesmo hospital. Esse problema pode estar relacionado a três fatores principais: por ser um serviço recente; pelo período de férias acadêmicas interromperem a agenda de atendimentos; e o fato de as consultas não oferecerem a realização do exame citopatológico do colo do útero, comumente chamado de exame preventivo, serviço este muito procurado.

Esse primeiro fator, que pode ser apontado como um dos responsáveis pela baixa adesão das mulheres seria o fato do serviço ofertado ainda ser recente. Diante disso, pode-se pensar na possibilidade e na necessidade de maior divulgação do ambulatório em outros ambientes externos ao hospital em que é realizado, atraindo um público maior.

Outro fator seria a interrupção da agenda de atendimentos devido ao período de férias acadêmicas. Como há a suspensão dos atendimentos, e consequentemente de sua divulgação, acaba sendo demorado o período para que o fluxo seja normalizado. Uma solução seria manter o atendimento durante o período de férias, mesmo que numa frequência menor, ofertando as consultas de forma quinzenal.

Outro fator negativo seria o fato das atuais consultas não oferecerem a realização do exame preventivo. É importante ressaltar que na atenção primária, as consultas às mulheres abordam tanto a prevenção do câncer de colo de útero quanto a detecção precoce do câncer de mama, o que explica essa procura pela realização do preventivo também no ambulatório. Apesar de o projeto focar na assistência ao câncer mamário, seria uma proposta interessante aliar também a assistência no câncer de colo de útero durante as consultas realizadas, oportunizando o cuidado integral às mulheres. Isso poderia beneficiar os discentes com um campo maior para aprendizado.

Há também dificuldades em relação ao sistema de referência e contrarreferência. Ocasionalmente, era realizado o encaminhamento de algumas mulheres com alta suspeita de câncer de mama para o acompanhamento especializado com mastologistas da instituição. Porém, não havia a contrarreferência com a resposta desse atendimento, perdendo o contato e vínculo com a mulher encaminhada. 

Uma hipótese que pode sustentar esse déficit no sistema de referência e contrarreferência é devido ao atendimento no ambulatório ser por demanda espontânea e ter baixa comunicação com a Atenção Primária em Saúde (APS), responsável por coordenar o itinerário dos usuários na rede de atenção à saúde. É a APS a responsável por manter o vínculo com os usuários e dar continuidade à atenção.19

Uma proposta que vise solucionar esse problema envolve maior diálogo com a APS e maior comunicação interprofissional com a equipe de mastologia, serviço especializado que a mulher é encaminhada, para que eles entendam a importância do feedback dos atendimentos. O sistema de referência e contrarreferência é fundamental para concretizar a integralidade dos atendimentos, garantindo maior eficiência e eficácia da assistência prestada.

Diferenciais

Dentre os diversos fatores positivos do ambulatório destacados, há ainda um diferencial em seu funcionamento: sua composição multiprofissional. Apesar de oferecer consultas de enfermagem, o atendimento prestado conta com a participação de discentes de diversos cursos da área da saúde envolvidos no projeto DE PEITO ABERTO.

É importante que durante o processo formativo os alunos tenham contato com esse trabalho multiprofissional. Esses espaços de convivência permitem uma visão integral, com cada profissão contribuindo de forma científica para a produção comum do cuidado. Esse processo desafiador, ao produzir um deslocamento na formação original de cada área, permite também que os envolvidos reinventem suas práticas através do processo de negociação e aprendizado.20,21

Vivenciar essa formação multiprofissional do ambulatório permitiu a construção de um olhar holístico, amplo, sobre o indivíduo e o processo de saúde-doença, valorizando o cuidado em equipe que respeita as particularidades de cada área, mas que busca o atendimento integral dos sujeitos. As ações multiprofissionais integraram o ensino, serviço e comunidade e permitiram o aprimoramento da habilidade de comunicação e relacionamento em equipe.

 Por fim, foi possível perceber através da experiência que esse convívio com as distintas áreas permite superar as deficiências da formação, reconhecendo a importância de cada categoria profissional. A saúde, por ser um processo complexo e dinâmico, necessita da adoção de um olhar plural em sua assistência.

Potencialidades

A atuação da enfermagem no câncer de mama é ampla, indo desde a detecção precoce e revelação do diagnóstico, até o período pré e pós-operatório da mastectomia, e inclusive nos cuidados paliativos e no processo de recuperação da saúde.21 Portanto, uma potencialidade do ambulatório percebida durante a existência foi a possibilidade de ampliação dos atendimentos, oferecendo além da assistência na detecção precoce do câncer de mama os cuidados pré e pós-operatório.22

As orientações nos momentos pré e pós-operatório devem ser individualizadas e claras, com prioridade ao autocuidado. Atuar neste período traria além de grandes ganhos para as mulheres atendidas, o aprimoramento de diversas habilidades, elucidando e complementando na prática os conteúdos aprendidos durante a formação acadêmica. Essa atuação permitiria a investigação, análise, e intervenção na realidade profissional.

A mastectomia, retirada cirúrgica parcial ou total da mama, traz muitas dúvidas e anseios para a mulher, o que requer um acolhimento adequado que envolva também a sua rede de apoio. O enfermeiro, juntamente com a equipe multidisciplinar, deve se atentar não somente aos aspectos físicos, mas também aos emocionais e aos sociais, apoiando a mulher para que este processo tão invasivo e modificador, que é a retirada da mama, represente um momento de menor abalo emocional.23-25 A enfermagem tem papel fundamental no processo de aceitação e continuidade do tratamento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante a elaboração e implementação do ambulatório foram evidenciados diversos fatores positivos que fortaleceram o seu funcionamento. Os atendimentos oportunizaram o exercício da prática clínica e da aplicação da SAE no processo de trabalho. Possibilitou, ainda, o aprimoramento da habilidade de tomada de decisões e da capacidade de diagnosticar e solucionar problemas de saúde. Ademais, além de viabilizar a prática da educação em saúde, toda a preparação do ambulatório foi um momento de rico aprendizado, pois foi necessário que os discentes intensificassem as pesquisas sobre o câncer de mama. Tudo isso contribuiu para o desenvolvimento de uma formação técnico-científica com qualidade.

Dentre os diversos fatores positivos, há ainda um diferencial em seu funcionamento: sua formação multidisciplinar, sendo um convite ao aprendizado coletivo. Além de permitir o aprimoramento da habilidade de comunicação e relacionamento em equipe, a multidisciplinaridade enseja ainda a construção de um olhar holístico sobre o indivíduo e o processo de saúde-doença, valorizando o trabalho em conjunto e buscando o atendimento integral dos sujeitos.

Apesar dos diversos fatores positivos, é possível também observar alguns fatores negativos durante sua implementação, sendo o baixo número de atendimentos o principal deles. Uma das hipóteses levantadas a respeito seria o fato de as atuais consultas não oferecerem a realização do preventivo. Ainda que não seja o foco do projeto, seria interessante aliar a assistência ao câncer de colo de útero durante as consultas realizadas, oportunizando e valorizando esse momento de cuidado. Isso, além de beneficiar os discentes com um campo maior para aprendizado, atenderia de uma forma mais integral a saúde das mulheres.

Ademais da possibilidade de oferecer assistência ao câncer de colo de útero, outra potencialidade percebida no ambulatório foi a possibilidade de ampliação dos seus atendimentos, promovendo não só a assistência na detecção precoce do câncer de mama, como também os cuidados pré e pós-operatório. Atuar neste período traria o aprimoramento de diversas habilidades, elucidando e complementando na prática os conteúdos aprendidos durante a formação acadêmica. 

Durante a realização do estudo foi possível perceber por meio da prática vivenciada a importância em se destacar o potencial da enfermagem para transitar nos distintos contextos da profissão, trazendo maior visibilidade para sua atuação em ambulatórios.

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Recebido em: 07/07/220

Aceito em: 06/05/2021

Publicado em: 10/09/2021



[1] Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Juiz de Fora, Minas Gerais (MG). Brasil (BR). E-mail: brenda.torquato@hotmail.com ORCID: 0000-0002-2669-0500

[2] Centro Universitário Estácio de Sá. Juiz de Fora, Minas Gerais (MG). Brasil (BR). E-mail: enfleidi@gmail.com ORCID: 0000-0001-9953-1220

[3] Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Juiz de Fora, Minas Gerais (MG). Brasil (BR). E-mail: bittencourt.jfv@hotmail.com ORCID: 0000-0001-9395-4388

[4] Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Juiz de Fora, Minas Gerais (MG). Brasil (BR). E-mail: simeiracarvalho@hotmail.com ORCID: 0000-0002-7680-131X

 

Como citar: Ribeiro BT, Ferraz LM, Bittencoutr JFV, Carvalho SM. Prática ambulatorial de enfermagem na prevenção do câncer de mama: relato de experiência. J. nurs. health. 2021;11(4):e2111419126. Disponível em: https://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/enfermagem/article/view/19126