ARTIGO ORIGINAL

Cultura de segurança do paciente em centro cirúrgico na perspectiva da equipe de enfermagem

Patient safety culture in surgical center from perspective of the nursing team

Cultura de seguridad del paciente en centro quirúrgico en la perspectiva del equipo de enfermería

Fagundes, Thaís Ender[1]; Acosta, Adriano da Silva[2]; Gouvea, Pollyana Bortholazzi[3]; Massaroli, Rodrigo[4]; Rangel, Rita de Cássia Teixeira[5]; Andrade, Patrícia Daiana[6]

RESUMO

Objetivo: analisar a cultura de segurança do paciente em Centro Cirúrgico na perspectiva da equipe de enfermagem. Método: estudo transversal desenvolvido em dois hospitais da região sul do país, com 77 profissionais de enfermagem do Centro Cirúrgico. Os dados foram coletados entre junho e julho de 2019, por meio da aplicação do questionário Hospital Survey on Patient Safety Culture. Na análise e interpretação de dados foi seguido as diretrizes da Agency for Healthcare Research and Quality. Resultados: comparando os hospitais, o Hospital 2 teve maior frequência de positividade na dimensão “expectativas e ações de promoção da segurança do paciente do supervisor/gerente” (p<0,001). Já para a dimensão “trabalho em equipe entre as unidades do hospital”, o Hospital 1 teve maior frequência (p=0,028). Conclusão: os resultados indicam que a cultura de segurança precisa ser fortalecida nos locais do estudo, com especial atenção àquelas dimensões com avaliação menos positiva.

Descritores: Cultura organizacional; Segurança do paciente; Centros cirúrgicos; Enfermagem

ABSTRACT

Objective: to analyze the culture of patient safety in the operating room from the perspective of the nursing team. Method: cross-sectional study, developed in two hospitals in the southern region of the country, with 77 professionals from the nursing of the operating room. Data were collected between June and July 2019 by applying the Hospital Survey on Patient Safety Culture questionnaire. In the analysis and interpretation of the data the guidelines of the Agency for Healthcare Research and Quality were followed. Results: when compared the hospitals, Hospital 2 had a higher frequency of positivity in the dimension “expectations and actions to promote patient safety from the supervisor/manager” (p<0.001). For the dimension “teamwork between hospital units”, Hospital 1 had a higher frequency (p=0.028). Conclusion: the results indicate that the safety culture needs to be strengthened in the study sites, with special attention to those dimensions with the least positive assessment.

Descriptors: Organizational culture; Patient safety; Surgicenters; Nursing

RESUMEN

Objetivo: analizar la cultura de seguridad del paciente en centro quirúrgico en la perspectiva equipo de enfermería. Método: estudio transversal desarrollado en dos hospitales del sur del país, con 77 profesionales de enfermería del quirófano. Los datos se recopilaron entre junio y julio de 2019 aplicando el cuestionario Hospital Survey on Patient Safety Culture. En el análisis e interpretación de los datos se siguieron las orientaciones de la Agencia de Investigación y Calidad Sanitaria. Resultados: comparando los hospitales, el Hospital 2 tuvo una mayor frecuencia de positividad en la dimensión "expectativas y acciones para promover la seguridad del paciente por el supervisor/gerente" (p<0,001). Para la dimensióntrabajo en equipo entre unidades hospitalarias”, el Hospital 1 tuvo una mayor frecuencia (p=0,028). Conclusión: es necesario fortalecer la cultura de seguridad en los sitios de estudio, con especial atención a aquellas dimensiones con la evaluación menos positiva.

Descriptores: Cultura organizacional; Seguridad del paciente; Centros quirúrgicos; Enfermería

INTRODUÇÃO


A cultura de segurança do paciente tem se tornado uma temática frequente, oportunizando quebra de paradigmas e discussões, bem como voltando à atenção das instituições de saúde e de seus profissionais para a segurança do paciente, propiciando a efetividade e melhora na qualidade da assistência prestada aos pacientes.1-2

Nesse cenário, a segurança do paciente pode ser exemplificada como a atenuação, a um mínimo aceitável, dos perigos vinculados ao cuidado de saúde, objetivando evitar consequências danosas desnecessárias dos cuidados daqueles que requisitam os serviços de saúde.3 Já a cultura de segurança deriva do conjunto de percepções, valores, atitudes e competências, tanto individuais como grupais, em prol de um comportamento e comprometimento com a segurança ofertada pelas instituições.4

A propagação da cultura de segurança nos serviços de saúde respalda uma comunicação efetiva, fortalecimento da relação interpessoal envolvendo a equipe, paciente e família, bem como a confiabilidade mútua e efetividade das medidas preventivas. Ainda, proporciona que a equipe compartilhe entre si suas fragilidades, possibilitando a avaliação do cenário, buscando mudanças no processo de trabalho com a finalidade de conter danos ao paciente e a equipe.5

Diante desta conjuntura, a segurança do paciente tornou-se uma inquietação para os ambientes de saúde, sobretudo na unidade de Centro Cirúrgico (CC), em que se busca prestar uma assistência de excelência, a identificação dos fatores que acometem a segurança do paciente torna-se fundamental, projetando a possibilidade de danos que possam ocorrer por meio da assistência ofertada.6

Infelizmente, esse ambiente de saúde revela-se como um dos setores com maiores índices de eventos adversos, cujas causas são multifatoriais, principalmente atribuídas à relação das equipes interdisciplinares, à complexidade dos procedimentos e ao trabalho sob pressão.6

Sob esse aspecto, investigar a cultura de segurança do paciente origina a possibilidade de conhecer questões de significância para as rotinas e o contexto de trabalho. Essa abordagem permite a obtenção de informações dos profissionais sobre suas percepções e atitudes relacionadas à segurança, distinguindo aspectos enfraquecidos e fortalecidos de sua cultura de segurança e as áreas fragilizadas, propiciando a elaboração e efetivação de intervenções.7

Neste sentido, compreende-se a importância do desenvolvimento deste estudo na avaliação da cultura de segurança no CC em dois hospitais de referência na região sul do país. A relevância do estudo está pautada nas informações a serem apresentadas aos gestores destas instituições, proporcionando informações reais quanto as dimensões da cultura de segurança das instituições de saúde em relação ao ambiente complexo que é o CC. Cabe salientar ainda, que a proposta do estudo é estimular cada vez mais a cultura de segurança por meio de uma relação de confiança.   

Diante desse contexto, busca-se responder o seguinte questionamento: Como os profissionais de enfermagem percebem a cultura de segurança do paciente no CC em dois hospitais de referência na região sul do país? Dessa forma, objetivou-se analisar a cultura de segurança do paciente em Centro Cirúrgico na perspectiva da equipe de enfermagem.

MÉTODO

Estudo transversal e comparativo de natureza quantitativa, desenvolvido nas unidades de CC de dois hospitais públicos localizados na Macrorregião de Saúde da Foz do Rio Itajaí, no estado de Santa Catarina.

A população da pesquisa foi composta por profissionais da equipe de enfermagem que exerciam suas atividades no setor já mencionado, composta por sete enfermeiros e 54 técnicos de enfermagem no Hospital 1, e cinco enfermeiros e 24 técnicos de enfermagem no Hospital 2, totalizando 90 profissionais. Nesse estudo utilizamos uma amostra não probabilística por conveniência.

Como critérios de inclusão foram utilizados: ser profissional de enfermagem durante o período de coleta dos dados nas unidades. Foram excluídos os profissionais de enfermagem que atuavam a menos de seis meses nessas unidades ou que estivessem de férias ou licença saúde. Assim, do total de profissionais elegíveis nesse estudo, sete pessoas optaram em não participar do estudo ou não devolveram o instrumento, três apresentavam tempo menor que seis meses de atuação na unidade e três estavam de férias no período da coleta de dados, totalizando 77 participantes.

A coleta de dados foi realizada entre os meses de junho e julho de 2019 por meio da aplicação de um instrumento elaborado em 2004 pela Agency for Healthcare Research and Quality (AHRQ) dos Estados Unidos, disponível para domínio público. O instrumento é denominado Hospital Survey on Patient Safety Culture (HSOPSC), aplicado para verificação da cultura de segurança. A versão utilizada no estudo foi traduzida e adaptada para o idioma português.7

Após a liberação das instituições participantes do estudo, os pesquisadores efetivaram os convites a todos os profissionais das unidades de CC para participarem da pesquisa. Se encaminharam aos locais do estudo e fizeram a distribuição dos questionários, que na sequência eram depositados em envelopes e entregues aos pesquisadores em dias e horários pré-estabelecidos.

O HSOPSC é um instrumento que contém 42 questões relacionadas a cultura de segurança do paciente que são agrupadas em 12 dimensões: Trabalho em equipe na unidade; Expectativas e ações do supervisor/chefia para a promoção da segurança do paciente; Aprendizado organizacional – melhoria contínua; Apoio da gestão hospitalar para segurança do paciente; Percepção geral da segurança do paciente; Feedback e comunicação sobre erros; Abertura para comunicação; Frequência de eventos comunicados; Trabalho em equipe entre as unidades hospitalares; Quadro de funcionários; Transferências internas e passagem de plantão; Resposta não punitiva ao erro.8

As 12 dimensões foram analisadas individualmente nas unidades de CC utilizando-se a escala Likert, com incumbências que variam de “discordo totalmente” a “concordo totalmente”. A análise de cada dimensão foi efetuada a partir da porcentagem de respostas positivas obtida pelo cálculo da combinação das duas categorias mais altas de resposta. Percentuais mais altos indicam atitudes positivas em relação a cultura de segurança.9

Na análise e interpretação dos dados foram seguidas as recomendações da AHRQ. O percentual de respostas positivas retrata uma reação positiva em relação a cultura de segurança do paciente e oportuniza distinguir áreas fortes e frágeis. Foram consideradas “áreas fortes da segurança do paciente” aquelas cujos itens escritos positivamente obtiveram 75% de respostas positivas (“concordo totalmente” ou “concordo”), ou aquelas cujos itens escritos negativamente, obtiveram 75% das respostas negativas (“discordo totalmente” ou “discordo”). De modo semelhante, “áreas frágeis da segurança do paciente” e que necessitam melhoria foram consideradas aquelas cujos itens obtiveram 50% ou menos de respostas positivas.8

Os dados foram digitados no programa Excel e posteriormente importados para o programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 20.0 para análise estatística. Foram descritas as variáveis categóricas por frequências e percentuais e comparadas pelo teste de qui-quadrado com correção de Yates. As variáveis quantitativas foram avaliadas em relação à sua simetria pelo teste de Kolmogorov Smirnov. As variáveis quantitativas com distribuição simétrica foram descritas pela média e o desvio padrão e as com distribuição assimétrica foram descritas pela mediana e o intervalo interquartil (percentis 25 e 75). Considerou-se um nível de significância de 5% para as comparações estabelecidas.

Este estudo atendeu as Resoluções 466/2012, 510/16 e 580/2018 do Conselho Nacional de Saúde, e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Vale do Itajaí com parecer nº 3.412.675 e Certificado de Apresentação para Apreciação Ética nº 11979519.0.0000.0120, em 25 de junho de 2019. Todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

RESULTADOS

A amostra foi constituída por 77 profissionais, com predomínio do sexo feminino (80,5%). A média de idade foi de 38,3 anos (±9,8), com prevalência para a escolaridade ensino médio completo (71,4%). A maior parte dos profissionais eram técnicos de enfermagem (89,6%), seguidos por enfermeiros (10,4%). Em relação a carga horária de trabalho semanal destaque para os profissionais que trabalham entre 40 e 50h semanais (80,5%). Quanto ao tempo de trabalho na unidade e no hospital, percebe-se predomínio de um a cinco anos de tempo de trabalho na unidade (46,8%) e tempo de trabalho no hospital (49,4%). Os dados são apresentados na Tabela 1.

Tabela 1: Características sociodemográficas dos profissionais de enfermagem de CC em dois hospitais do sul do país. Itajaí (SC), Brasil, 2019.

Características

Hospital 1

Hospital 2

Total

Enfermeiros

Técnicos

Enfermeiros

Técnicos

n=4

n=47

n=4

n=22

n=77

Sexo feminino, n (%)

3 (75)

37 (78,7)

2 (50)

20 (90,9)

62(80,5)

Idade, média ± DP

41,3±8,3

36,6±9,2

33,3±5,3

42,5±11,0

38,3±9,8

Maior Grau instrução, n (%)

Ensino médio

0 (-)

39 (83,0)

0 (-)

16 (72,7)

55 (71,4)

Ensino superior completo

-

8 (17,0)

1 (25,0)

6 (27,3)

15 (19,5)

Pós-graduação

4 (100,0)

0 (-)

3 (75,0)

0 (-)

7 (9,1)

Tempo de trabalho no hospital, n (%)

Menos de 1 ano

1 (25,0)

3 (6,4)

0 (-)

5 (22,7)

9 (11,7)

1 a 5 anos

0 (-)

21 (44,7)

4 (100,0)

13 (59,1)

38 (49,3)

6 a 10 anos

1 (25,0)

9 (19,1)

0 (-)

4 (18,2)

14 (18,2)

11 a 15 anos

2 (50,0)

7 (14,9)

0 (-)

0 (-)

9 (11,7)

16 a 20 anos

0 (-)

4 (8,5)

0 (-)

0 (-)

4 (5,2)

21 anos ou mais

0 (-)

3 (6,4)

0 (-)

0 (-)

3 (3,9)

Tempo de trabalho CC, n (%)

Menos de 1 ano

1 (25,0)

2 (4,3)

1 (25,0)

5 (22,7)

9 (11,7)

1 a 5 anos

1 (25,0)

23 (48,9)

2 (50,0)

10 (45,5)

36 (46,8)

6 a 10 anos

1 (25,0)

5 (10,6)

0 (-)

5 (22,7)

11 (14,2)

11 a 15 anos

1 (25,0)

10 (21,3)

1 (25,0)

2 (9,1)

14 (18,2)

16 a 20 anos

0 (-)

4 (8,5)

0 (-)

0 (-)

4 (5,2)

21 anos ou mais

0 (-)

3 (6,4)

0 (-)

0 (-)

3 (3,9)

Carga horária semanal, n (%)

Menos de 20 h

0 (-)

1 (2,1)

0 (-)

0 (-)

1 (1,3)

20 a 39 h

0 (-)

4 (8,5)

0 (-)

3 (13,6)

7 (9,1)

40 a 50 h

3 (75,0)

36 (76,6)

4 (100,0)

19 (86,4)

62 (80,5)

60 a 79 h

1 (25,0)

6 (12,8)

0 (-)

0 (-)

7 (9,1)

Fonte: dados da pesquisa, 2019.

Em relação a avaliação da segurança do paciente no CC pelos participantes de cada instituição hospitalar, houve conceituação de segurança regular tanto no Hospital 1 (60,8%), como no Hospital 2 (38,5%), embora este último em menor proporção. Quando comparadas essas avaliações entre os profissionais dos dois hospitais, não foram apresentadas diferenças estatisticamente significativas entre elas (p-valor=0,206). Entretanto, somando os percentuais “excelente” e “muito boa” do Hospital 2, esses somam aproximadamente 40%. Estas frequências são apresentadas na Figura 1.

Figura 1: Avaliação da segurança do paciente no CC por profissionais de enfermagem em dois hospitais do sul do país (p-valor= 0,206). Itajaí (SC), Brasil, 2019.

Fonte: dados da pesquisa, 2019.

No que tange ao número de eventos adversos comunicados nos últimos 12 meses houve o predomínio em ambos os hospitais com nenhuma notificação, entretanto, 11 participantes do Hospital 1 relatam eventos adversos, sendo que seis (11,8%) relataram eventos adversos de uma a duas vezes; dois (3,9%) de 3 a 5 vezes; três (5,9%) relataram de 6 a 10 vezes e dois (3,9%) participantes optaram por não responder. Já no Hospital 2, seis profissionais comunicaram eventos adversos, entre esses cinco (19,2%) notificaram de uma a duas vezes e um (3,8%) de 3 a 5 vezes. Quando comparado o número de notificações entre os hospitais não foram apresentadas diferenças estatisticamente significativas (p-valor=0,531). Estes resultados são apresentados na Figura 2.

Figura 2: Percentual de eventos notificados pelos profissionais de enfermagem nos últimos 12 meses em dois hospitais do sul do país (p-valor =0,531). Itajaí (SC), Brasil, 2019.

Fonte: dados da pesquisa, 2019.

Considerando as 42 questões do instrumento HSOPSC destacam-se as dimensões que expressaram maiores percentuais de resposta positiva: 77,9% em expectativas e ações de promoção da segurança do paciente do supervisor/gerente no Hospital 2 e 65,4% em aprendizado organizacional-melhoria contínua no Hospital 1. Quando comparados os hospitais, houve maior frequência de positividade para o Hospital 2 quando comparado com o Hospital 1 na dimensão 2. Já para a dimensão 9, o Hospital 1 teve maior frequência de positividade que o Hospital 2, conforme apresentados na Tabela 2.

Tabela 2: Percentual de respostas positivas dos profissionais de enfermagem de CC em dois hospitais do sul do país. Itajaí (SC), Brasil, 2019.

Dimensões

Total

Hospital 1

Hospital 2

P-valor*

n =77

n =51

n =26

 

1 – Trabalho em equipe dentro das unidades

59,4%

59,3%

59,6%

0,999

2 – Expectativas e ações de promoção da segurança do paciente do supervisor/gerente

63,3%

55,9%

77,9%

<0,001

3 – Aprendizado organizacional, melhoria contínua

62,7%

65,4%

57,6%

0,319

4 – Feedback e comunicação a respeito de erros

38,9%

36,6%

43,5%

0,375

5 – Abertura para comunicações

42,9%

41,8%

45,6%

0,702

6 - Pessoal

35,5%

30,0%

46,1%

0,008

7 – Respostas não punitiva aos erros

21,6%

22,3%

20,5%

0,877

8 – Apoio da gestão hospitalar para a segurança do paciente

29,4%

30,7%

26,9%

0,656

9 – Trabalho em equipe entre as unidades do hospital

26,0%

29,9%

18,3%

0,028

10 – Transferências internas e passagem de plantão

28,9%

31,4%

26,9%

0,394

11 – Percepção geral da segurança do paciente

44,2%

43,3%

46,1%

0,714

12 – Frequência de eventos relatados

45,0%

40,5%

52,6%

0,109

Fonte: dados da pesquisa, 2019.

* Dados comparados pelo de qui-quadrado com correção de Yates.

A Figura 3 apresenta a avaliação das dimensões da cultura de segurança do paciente pelos profissionais de enfermagem do Hospital 1 e Hospital 2. Os escores representam o percentual de respostas positivas obtidas para cada dimensão.

Figura 3: Escores percentuais positivos das dimensões da cultura de segurança do paciente em centro CC em dois hospitais do sul do país. Itajaí (SC), Brasil, 2019.

Fonte: dados da pesquisa, 2019.

DISCUSSÃO

Pesquisas nacionais com profissionais de enfermagem certificam maior número de profissionais do sexo feminino na profissão, bem como na atuação dessas equipes nas unidades de CC. O resultado do presente estudo era esperado, visto que desde seu primórdio, a profissão foi denotada as mulheres por suas características intrínsecas voltadas ao cuidado.10-11

Quanto a interação da equipe com os pacientes, a maioria dos participantes (90,9%) afirmaram ter contato direto. Este dado corresponde com outra pesquisa que obteve um percentual semelhante (94,4%) de profissionais de enfermagem que exerciam atividades que demandavam aproximação com o paciente.12 Esse contato se faz primordial, visto que a partir desse momento cria-se um vínculo com os pacientes, estabelecendo uma relação de confiança, tendo tamanha importância durante o tratamento/recuperação deles. Nesse estudo, observamos que a equipe de enfermagem que não mantinha contato direto com os pacientes estava em atividades gerenciais e trabalhava na parte administrativa do CC.

Com relação ao tempo de trabalho nas instituições e na unidade do CC, quase metade dos participantes (49,4%) afirmou trabalhar em uma das instituições de 1 a 5 anos e (46,8%) estar no referido setor de 1 a 5 anos. Acredita-se que isso se dê devido à alta rotatividade dos profissionais entre as unidades e pela ocorrência de processo seletivo em uma das instituições como regime de trabalho. Essa maior rotatividade de profissionais pode implicar diretamente na qualidade da assistência prestada ao paciente,13 entretanto, o menor tempo de atuação pode se tornar um aspecto facilitador para moldar os profissionais em relação a cultura organizacional, uma vez que ao serem admitidos são apresentados a esses profissionais os princípios norteadores de segurança da instituição.6

Os resultados desta pesquisa demonstraram uma cultura de segurança fragilizada na maior parte das dimensões analisadas. A segurança do paciente estipulada pelos profissionais de enfermagem dos centros cirúrgicos foi “regular”. Este resultado se equipara a outro estudo realizado que verificou nesse mesmo setor predominância na classificação da segurança como “regular”.11

A classificação “regular” foi frisada em algumas pesquisas realizadas em nível nacional que utilizaram o mesmo instrumento.5,6,11 No entanto, uma pesquisa recente em instituições hospitalares da Palestina, confrontou seus resultados e de estudos efetuados em duas regiões semelhantes (Líbano e Arábia Saudita), indicando um grau de segurança do paciente maior que na Arábia Saudita (60%), já que sua porcentagem foi de 63,5%, mas abaixo dos resultados apresentados no Líbano (73,4%).14

Estes dados ratificam que países desenvolvidos demonstram melhores condições de apresentar uma segurança ao paciente com melhor eficácia. Em contraponto, os países subdesenvolvidos estão mais predispostos a ocorrência de situações prejudiciais que acabam propiciando a ocorrência de erros e eventos adversos. Questões como dimensionamento inadequado de pessoal, a superlotação das instituições, a falta de estrutura física adequada, bem como a escassez de equipamentos acabam interferindo na manutenção da segurança prestada aos pacientes. Além disso, as fragilidades em seu local de trabalho evidenciadas pelos profissionais de enfermagem são importantes, isso aliado ao apoio da direção hospitalar são indispensáveis para a elaboração de ações que oportunizem uma excelência no cuidado.11

Entre as dimensões de segurança do paciente estabelecidas pelo instrumento, os resultados alcançados demonstraram a ausência de dimensões com escore de respostas positivas superior a 75%, para dessa forma ser apontada como uma área de força para a cultura de segurança do paciente. Contudo, dimensões como “Expectativas e Ações de promoção da segurança do paciente do supervisor/gerente”, “Trabalho em equipe dentro das unidades” e “Aprendizado organizacional–melhoria contínua” revelaram-se como potenciais para se tornarem áreas de fortaleza na cultura de segurança das unidades de CC em questão. Tal resultado se equipara a um estudo efetuado no estado do Amazonas, em que “Aprendizado organizacional–melhoria contínua” obteve 60% de respostas positivas.15 Em outro estudo realizado em unidades de CC em Teresina/PI, a mesma dimensão obteve um escore de 58,7%.11 Estes achados atestam que os trabalhadores de enfermagem percebem que nessas instituições existe o objetivo da melhoria contínua, que proporciona o aprimoramento dos colaboradores. 

Destaca-se ainda a dimensão “Expectativas e ações de promoção da segurança do paciente do supervisor/gestor”, o Hospital 2 apresentou percentual de 77,9% individualmente, o que é considerado uma área forte para a segurança do paciente. Resultado semelhante foi detectado em um estudo realizado em um hospital de ensino no estado do Ceará.16 Entende-se que uma avaliação favorável dessa dimensão sugere que a equipe se sinta apoiada por seu supervisor/gerente, já que esse considera as sugestões feitas para o aperfeiçoamento da segurança do paciente, oportunizando a cooperação da equipe para a promoção de intervenções em prol da segurança do paciente.

Por outro lado, duas dimensões demonstraram resultados mais baixos de respostas positivas, sendo áreas consideradas de apreensão para a cultura de segurança do paciente, dentre elas: “Resposta não punitiva aos erros” e “Trabalho em equipe entre as unidades”. Estes resultados são compatíveis com outros estudos, o que vem consolidar a ideia de que a cultura punitiva inibe o reconhecimento e relato do erro por parte dos profissionais, negligenciando informações importantes, dificultando a identificação das situações e condições que cooperam para ocorrência do evento adverso e assim favorecendo a recorrência do erro.17-18  

Quanto ao trabalho em equipes entre as unidades, os dados obtidos demonstraram fragilidades no que tange a cultura de segurança entre as unidades de atendimento hospitalar. Outras investigações que se utilizaram deste mesmo instrumento e demonstraram fragilidades nessa dimensão, enfatizam a necessidade de intervenções com o objetivo de aprimoramento da coordenação, cooperação e comunicação entre os setores e suas equipes, abordando a necessidade de iniciativas que desenvolvam o trabalho entre as equipes das diferentes unidades.18-20

No que concerne ao número de eventos notificados, observa-se que foi nulo para 74,5% dos profissionais de enfermagem do Hospital 1, números parecidos aos apresentados no Hospital 2, onde 77% dos respondentes não notificaram eventos adversos. Esses resultados assemelham-se a um estudo realizado em um hospital público de grande porte, referência em média e alta complexidade na Bahia, em que 87,8% dos respondentes também não haviam notificado qualquer evento adverso no último ano da coleta dos dados.12 Vale ressaltar que a falta de notificações não significa que eventos adversos não ocorram, mas que a cultura de segurança não se encontra totalmente implantada nas unidades, visto que a cultura de segurança do paciente recomenda que incidentes devam ser comunicados, permitindo sua análise e propiciando que medidas preventivas e educativas sejam adotadas pelas instituições.21

A averiguação de um erro e o ato de relatá-lo são substanciais para a implantação de um plano com medidas preventivas, com o desígnio de recompor as condições do paciente, reduzindo os malefícios causados. A interlocução de uma falha em um ambiente delicado como o CC pode ser imprescindível para uma resolução adequada. Dessa forma, destaca-se a magnitude da notificação de eventos adversos como uma ação para prevenção de sua ocorrência, sendo este uma forma de aprendizado e de possível aperfeiçoamento da administração da cultura de segurança nas instituições de saúde.14

A dimensão “Pessoal”, em ambos os hospitais foi considerada pelos profissionais de enfermagem como frágil para a segurança do paciente, visto que o percentual do Hospital 1 foi de 30,0% e do Hospital 2 de 46,1%. Os resultados encontrados se assemelham a outras pesquisas nacionais.11,16 A adequação inapropriada de pessoal pode estar relacionada com sobrecarga de trabalho, trabalho sob pressão, descontentamento com o cenário de trabalho e com a jornada de trabalho.2 Estes fatores podem impactar na qualidade da assistência prestada aos pacientes, aumentando a taxas de eventos adversos. Assim, melhores condições de trabalho da equipe de enfermagem propiciam maior robustez da cultura de segurança do paciente.9

As análises da cultura de segurança do paciente nos serviços de saúde têm um papel relevante para o cuidado seguro, uma vez que estudos apontam as áreas fragilizadas, o que torna possível direcionar ações e atitudes para a prática de promoção a segurança do paciente. Entretanto, torna-se primordial a análise conjunta dos resultados obtidos pelos questionários aplicados e as características organizacionais de cada instituição hospitalar. Desta forma o HSOPSC fornece subsídios para o gerenciamento, planejamento e promoção de um ambiente de trabalho favorável, com perspectivas de uma assistência prestada ao paciente pelas organizações de saúde de maneira satisfatória e de qualidade.

CONCLUSÕES

O estudo traz uma realidade apresentada em dois hospitais da região sul do país, portanto, os dados encontrados não devem ser generalizados. A aplicação de um instrumento traduzido e validado no Brasil foi um ponto positivo para a pesquisa, pois viabilizou maior segurança e confiabilidade em sua utilização.

A análise dos dados coletados permitiu a identificação de fragilidades entre as dimensões de segurança do paciente nessas instituições, principalmente nas dimensões que dizem respeito a “respostas não punitivas aos erros”, “apoio da gestão hospitalar para a segurança do paciente”, “trabalho em equipe entre as unidades do hospital” e “transferências internas e passagem de plantão”, visto que estas necessitam da execução de intervenções de melhoria entre as instituições de saúde onde foram aplicados os instrumentos.

Vale salientar que essa é uma temática abstrata, suscitada pela cultura de segurança já existente em outras instituições hospitalares estudadas. Indica-se expandir essa investigação para outros ambientes de saúde, no intuito de fomentar novas discussões na esfera do ensino, da pesquisa, da assistência e da gestão, causando empatia dos profissionais de saúde acerca do tema, aprimorando a assistência à saúde.

Como limitação acerca do estudo, podemos apontar a aplicação do instrumento apenas aos profissionais de enfermagem da unidade. Dessa forma, os resultados apresentados podem não apresentar a cultura de segurança do paciente acerca de outros profissionais de saúde que atuam na equipe multiprofissional do local de coleta.

REFERÊNCIAS

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2 Andrade LEL, Lopes JM, Souza Filho MCM, Vieira Júnior RF, Farias LPC, Santos CCM, Gama ZAS. Cultura de segurança do paciente em três hospitais brasileiros com diferentes tipos de gestão. Ciênc. Saúde Colet. [Internet]. 2018[acesso em 2019 out 16];25(1):161-72. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1413-81232018231.24392015

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Recebido em: 04/09/2020

Aceito em: 29/06/2021

Publicado em: 13/07/2021



[1] Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Itajaí, Santa Catarina (SC). Brasil (BR). E-mail: thais_fagundes2008@hotmail.com ORCID: 0000-0003-3814-1661

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[3] Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Itajaí, Santa Catarina (SC). Brasil (BR). E-mail: pollyana_bortholazzi@yahoo.com.br ORCID: 0000-0002-5183-828X

[4] Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Itajaí, Santa Catarina (SC). Brasil (BR). E-mail: massaroli@univali.br ORCID: 0000-0002-7746-9021

[5] Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Itajaí, Santa Catarina (SC). Brasil (BR). E-mail: rctrangel@gmail.com ORCID: 0000-0001-9713-0220

[6] Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Itajaí, Santa Catarina (SC). Brasil (BR). E-mail: patriciajoaoandrade@gmail.com ORCID: 0000-0003-2140-412X

 

Como citar: Fagundes TE, Acosta AS, Gouvea PB, Massaroli R, Rangel RCT, Andrade PD. Cultura de segurança do paciente em centro cirúrgico na perspectiva da equipe de enfermagem. J. nurs. health. 2021;11(2):e2111219510. Disponível em: https://periodicos.ufpel.edu.br/ojs2/index.php/enfermagem/article/view/19510