Entre os livros e o beb�: reorganiza��o familiar em apoio � nutriz-estudante universit�ria
Between books and the baby: family reorganization in support of the university student lactating mother
Entre los libros y el beb�: reorganizaci�n familiar en apoyo a la madre lactante-estudiante universitaria
Van der Sand, Isabel Cristina Pacheco;[1] Cabral, Fernanda Beheregaray;[2] Girardon-Perlini, Nara Marilene Oliveira;[3] Hildebrandt, Leila Mariza;[4] Silveira, Andressa da;[5] Massariol, Ana Maria[6]
RESUMO
Objetivo: conhecer viv�ncias de fam�lias de mulheres que decidiram amamentar durante a gradua��o em enfermagem. M�todo: estudo explorat�rio e descritivo, de abordagem qualitativa, realizado em munic�pio do sul do Brasil em 2016. Participaram da investiga��o seis fam�lias de mulheres, universit�rias ou egressas, com viv�ncia do processo de amamenta��o durante o curso de gradua��o em enfermagem, totalizando 16 participantes. Para produ��o de dados, utilizou-se a entrevista aberta e constru��o de genograma, os quais foram submetidos � an�lise de conte�do tem�tica. Resultados: as categorias elaboradas revelam sobre a reorganiza��o da din�mica familiar em apoio � decis�o da mulher de amamentar e continuar seus estudos. Conclus�o: as fam�lias reorganizam seus cotidianos para atender �s demandas oriundas do nascimento de um beb�, em que companheiro e av� materna contribuem nas diferentes tarefas dom�sticas e cuidados � crian�a, para que a estudante nutriz continue amamentando, refor�ando o v�nculo m�e e filho, e mantenha seus estudos.
Descritores: Aleitamento materno; Fam�lia; Rela��es familiares; Estudantes de enfermagem; Enfermagem familiar
ABSTRACT
Objective: to learn about the experiences of families of women who decided to breastfeed during their nursing graduation. Method: qualitative study conducted in a municipality in southern Brazil in 2016. Six families of women, university students or graduates, with experience of the breastfeeding process during the undergraduate nursing course, participated in the investigation, totaling sixteen participants. The data was from open interviews and genogram construction and treated by content analysis. Results: the elaborated categories reveal the reorganization of family dynamics in support of the woman's decision to breastfeed and continue her studies. Conclusion: families reorganize their daily lives to meet the demands arising from the birth of a baby, in which the partner and maternal grandmother contribute to the different household tasks and care for the child, so that the nursing student continues to breastfeed, reinforcing the mother-child bond, and keep your studies.
Descriptors: Breast feeding; Family; Family relations; Students, nursing; Family nursing
RESUMEN
Objetivo: conocer las experiencias de familias de mujeres que decidieron amamantar durante su graduaci�n en enfermer�a. M�todo: estudio cualitativo realizado en un municipio del sur de Brasil en 2016. Participaron de la investigaci�n seis familias de mujeres, estudiantes universitarias o graduadas, con vivencia del proceso de lactancia materna durante el curso de graduaci�n en enfermer�a, totalizando diecis�is participantes. Los datos fueron de entrevistas abiertas y construcci�n de genograma y tratados por an�lisis de contenido. Resultados: tiene la reorganizaci�n de la din�mica familiar en apoyo a la decisi�n de la mujer de amamantar y continuar sus estudios. Conclusi�n: las familias reorganizan su cotidiano para atender las demandas derivadas del nacimiento de un beb�, en el cual la pareja y abuela materna contribuyen en las diferentes tareas del hogar y cuidado del ni�o, para que la estudiante de enfermer�a contin�e amamantando, reforzando v�nculo de la madre con hijo, y manteniendo tus estudios.
Descriptores: Lactancia materna; Familia; Relaciones familiares; Estudiantes de enfermer�a; Enfermer�a de la familia
INTRODU��O
No s�culo passado, era incomum uma mulher em processo de amamenta��o dedicar-se ao trabalho e aos estudos. Por�m, nos dias atuais esta � uma realidade, considerando que a primeira gravidez em mulheres do sul do Brasil, local em que este estudo foi realizado, ocorre por volta dos 22 anos, faixa et�ria em que jovens est�o ingressando, cursando ou at� mesmo, em fase de conclus�o da gradua��o.1 Esse fato instigou as autoras a debru�arem-se sobre a tem�tica da amamenta��o vivenciada por universit�rias e sua repercuss�o sobre a din�mica familiar, entendida como movimentos realizados pelos membros das fam�lias na rotina di�ria e no enfrentamento de eventos que acometam o grupo familiar, tais como doen�as, conflitos e outras adversidades.2
O interesse pela din�mica familiar no contexto da amamenta��o e vida universit�ria justifica-se porque, para muitas mulheres-estudantes-nutrizes, a fam�lia � a base e o suporte para a continuidade dos estudos, o que geralmente exige reorganiza��o de sua din�mica. Neste estudo ser� usada a imexpress�o mulher-estudante-nutriz, o que decorre de uma op��o te�rico-metodol�gica e filos�fica, pois se entende que as mulheres, na gravidez e como nutrizes, vivenciam situa��o que � transit�ria, a qual, apesar da transitoriedade, tende a inviabilizar a mulher como sujeito social de necessidades, demandas e vulnerabilidades que est�o para al�m da maternidade e de sua condi��o de lactante. Ainda, essa ser� empregada no singular ou plural, conforme a necessidade gramatical como refer�ncia a mulheres que vivem ou viveram a situa��o de estudar e amamentar, estudantes ou egressas.
A defini��o de fam�lia, propriamente dita, constitui-se em tarefa complexa, dadas as diferentes conforma��es existentes. Por outro lado, � inquestion�vel que a fam�lia, independentemente de sua forma��o, tem implica��es nas escolhas relacionadas � sa�de de seus membros3-4 e, neste caso, na decis�o de aleitar e dar continuidade aos estudos universit�rios. Assim, a defini��o de fam�lia adotada nesta pesquisa remete a de que � fam�lia quem seus membros dizem que s�o.2
No Brasil � garantido, � estudante, regime de estudos domiciliares a partir do oitavo m�s de gesta��o e tr�s meses posteriores � data de nascimento da crian�a. Portanto, pressup�e-se que as mulheres-estudantes-nutrizes, se desejarem, ter�o os tr�s primeiros meses para amamentar seu beb� no domic�lio. Entretanto, o direito a exerc�cios domiciliares n�o se aplica a disciplinas com atividades pr�ticas ou est�gios supervisionados,5 o que reflete na necessidade de as estudantes de gradua��o retornarem para o �mbito universit�rio e implica na redu��o e, em alguns casos, na interrup��o da amamenta��o exclusiva.
Desta forma, conciliar a continuidade da amamenta��o com a gradua��o pode ser desafiador e gerar sobrecarga, o que potencialmente refletir� na qualidade de vida dessa mulher-estudante-nutriz. Neste sentido, � fundamental a exist�ncia de uma rede apoio � mulher, representada pela fam�lia e pela institui��o de ensino.6-8
O grupo familiar modula, por meio da cultura e transmiss�o de experi�ncias, os preceitos de qu�o importante � ou n�o amamentar, sendo relevante que a Enfermagem conhe�a e compreenda a din�mica familiar, a fim de produzir com a fam�lia pr�ticas de promo��o, apoio e incentivo � amamenta��o.3 Salienta-se que, neste estudo, h� o entendimento de que a fam�lia � um n�cleo de cuidados, ou seja, que presta cuidados e os demanda. Compreende-se, assim, que aleitar transcende ao desejo exclusivo da mulher, ou seja, a fam�lia e a sociedade s�o determinantes nas decis�es relativas � tem�tica.
Frente a essas considera��es, tem-se como quest�o de pesquisa: como se d� a viv�ncia da fam�lia de mulheres-nutrizes-estudantes que decidem amamentar durante um curso de gradua��o em enfermagem? Objetiva-se conhecer viv�ncias de fam�lias de mulheres que decidiram amamentar durante a gradua��o em enfermagem.�
MATERIAIS E M�TODO
Trata-se de um estudo de caso de abordagem qualitativa, realizado em munic�pio do sul do Brasil. Essa estrat�gia metodol�gica investiga, em profundidade, fen�menos sociais contempor�neos em seu contexto de vida, desde uma problem�tica mais ampla, mediante a particulariza��o do caso que, apesar do car�ter singular, possibilita a apreens�o de muitos aspectos ou experi�ncias que s�o gerais e que podem ser transfer�veis a outros casos pelas similaridades das condi��es particulares e contextuais de cada situa��o.9
O estudo iniciou-se com a identifica��o e localiza��o de estudantes do curso de enfermagem, de um dos campi de uma universidade p�blica do Sul do Brasil, que tivessem vivenciado ou vivenciando a situa��o de continuar os estudos universit�rios em concomit�ncia ao aleitamento materno. A partir da apresenta��o da proposta de pesquisa � coordena��o do curso de enfermagem, realizou-se a visita �s cinco turmas que comp�em o curso. A� foi explicitado o objetivo do estudo e emitido convite �s estudantes que se adequassem ao fen�meno de interesse ao estudo. O convite aos familiares foi realizado pelas estudantes, n�o havendo limite no n�mero de participantes, justificado pela defini��o de fam�lia adotada no estudo. Foi solicitada tamb�m, nessa ocasi�o, a indica��o de egressas que tiveram essa viv�ncia.
A op��o pelas estudantes e egressas de um curso de enfermagem, para chegar �s suas fam�lias, justifica-se pela elevada carga hor�ria de disciplinas te�rico-pr�ticas no curso, o que as limita na obten��o de licen�a-maternidade e pode interferir de algum modo no processo de amamenta��o. Desta forma, adotaram-se como crit�rios de sele��o para o estudo, referentes �s estudantes/egressas, que essas tivessem sido gestantes durante o curso e desejado amamentar. Quantos aos familiares, esses deveriam ter sido indicados pela estudante/egressa e estar domiciliado no munic�pio-sede do campus onde foi realizado o estudo.
Ap�s o aceite, agendou-se a visita ao domic�lio, na qual a pesquisadora apresentou � fam�lia o objetivo do estudo e a trajet�ria metodol�gica e, na concord�ncia dos familiares indicados, foi iniciado o processo de coleta de dados.
O tamanho da amostra foi definido pelo processo de satura��o dos dados, entendido n�o somente pela revela��o de redund�ncia e duplica��o de conte�do, mas tamb�m como algo que deve refletir �as m�ltiplas dimens�es de determinado fen�meno e a qualidade das a��es e das intera��es em todo o decorrer do processo�, cuja determina��o aconteceu durante a coleta dos dados.10:9 Assim, participaram do estudo seis fam�lias, com um total de dezesseis indiv�duos: seis mulheres-estudantes-nutrizes, das quais quatro eram estudantes e duas egressas; tr�s companheiros; e, sete av�s dos filhos dessas mulheres, sendo quatro maternas, uma paterna, um av� materno e um paterno. Um dos familiares convidados recusou-se a participar do estudo.
A produ��o de dados ocorreu em 2016, por meio de entrevista realizada no domic�lio das fam�lias, devido � percep��o de que as intera��es entre os membros do n�cleo familiar mostram-se mais intensas e fi�is � realidade nesse cen�rio, visto que esse � um ambiente conhecido aos participantes da investiga��o, sendo prop�cio, inclusive, para a promo��o de alguns rituais de sociabilidade na presen�a do pesquisador, o que pode auxiliar na compreens�o do fen�meno em estudo.2
A entrevista teve dura��o m�dia de 40 minutos, foi gravada em m�dia digital e transcrita, manualmente, a partir das seguintes quest�es: Como foi, para a fam�lia, da mulher-estudante-nutriz, seguir estudando enquanto amamentou ou desejou amamentar? Conte-me o que ocorreu. As transcri��es das entrevistas n�o foram validadas pelos participantes.
Al�m da quest�o aberta, foi elaborado junto com os participantes o genograma da fam�lia, por ser um diagrama representativo do grupo familiar, ferramenta fundamental para que a enfermeira/pesquisadora possa �pensar a fam�lia�.2
Destaca-se que, a partir de cada entrevista, houve registro em di�rio de campo acerca da experi�ncia da entrevistadora no encontro com cada fam�lia. Nele registraram-se as peculiaridades e especificidades relativas � constitui��o de cada n�cleo familiar, as rela��es percebidas pela pesquisadora que parecem permear a conviv�ncia em fam�lia. Na intera��o com cada fam�lia, constatou-se a necessidade e a expectativa de cada n�cleo familiar em falar e ser ouvido.
Os dados produzidos foram submetidos � an�lise tem�tica11 composta por tr�s etapas. Na pr�-an�lise, procedeu-se a leitura exaustiva mediante o contato com o material produzido a fim de se obter a impregna��o das informa��es a� contidas; na etapa de explora��o do material, os dados foram categorizados, recortando-se o texto e agrupando-se as unidades de registro por afinidade tem�tica; por �ltimo, buscou-se a compreens�o e interpreta��o dos resultados, integrando-os ao referencial de ancoragem e de cotejamento.
O estudo foi orientado pela diretriz Consolidated Criteria for Reporting Qualitative Research (COREQ). A pesquisa respeitou os preceitos da Resolu��o 466/2012 e foi aprovada por Comit� de �tica em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) conforme Parecer n�. 1.487.594. Assim, se garantiu a confidencialidade das informa��es e o anonimato dos participantes/fam�lias, utilizando-se codifica��o para cada fam�lia e seus membros. Para a primeira fam�lia a inserir-se no estudo foi usado o c�digo F1; para a mulher que estudou durante o processo de amamenta��o desta fam�lia usou-se um c�digo correspondente � mulher-estudante-nutriz e a identifica��o de sua fam�lia (MEN-F1); para os familiares escolhidos por ela para participar do estudo foram utilizados os seguintes c�digos: C-F1, para o companheiro; AM♀ para av� materna; AP♀ para a av� paterna; AM ♂ para av� materno.
RESULTADOS
Referente � caracteriza��o dos participantes deste estudo, das seis mulheres que tiveram a experi�ncia de amamentar seus filhos enquanto cursavam enfermagem, � �poca da entrevista, duas j� haviam conclu�do a gradua��o e quatro ainda estavam cursando enfermagem. Dentre as participantes, quatro, ao engravidar, estavam na faixa et�ria dos 20 anos, enquanto duas tinham 30 anos ou mais. Quanto ao estado civil, uma era casada, duas viviam em regime de uni�o est�vel, duas eram separadas/divorciadas e uma era solteira. Quanto � ocupa��o, das quatro estudantes, uma, al�m de estudar, exercia atividade laboral; entre as egressas, ambas trabalhavam, uma como enfermeira e a outra n�o. Em rela��o � modalidade de aleitamento materno, quatro mantiveram o aleitamento materno misto desde que retornaram ao meio acad�mico, enquanto uma amamentou exclusivamente at� o quarto m�s e outra at� o sexto. Esta se afastou das atividades acad�micas durante um ano, por meio de solicita��o de trancamento do curso, utilizando-se duas vezes desse recurso. Outras caracter�sticas encontram-se no Quadro 1.
Quadro 1: Caracteriza��o das mulheres-nutrizes-estudantes participantes do estudo, Rio Grande do Sul, Brasil, 2017.
Participante |
Modalidade de AM |
Idade do lactente no retorno � universidade |
Idade do desmame |
Semestre curricular de retorno � universidade |
N�mero de disciplinas cursadas |
Planejamento da gesta��o |
MEN 1 |
Misto |
23 dias |
6 meses |
8� |
Todas do semestre |
N�o |
MEN 2 |
Misto |
40 dias |
7 meses |
4� |
Todas do semestre |
N�o |
MEN 3 |
Misto |
2 meses |
1 ano e 4 meses |
7� |
Todas do semestre |
Sim |
MEN 4 |
Exclusivo at� 6� m�s |
8 meses |
Ainda � amamentado (tem 2 anos) |
4� |
N�o |
N�o |
MEN 5 |
Misto |
15 dias |
20 dias |
8� |
Todas do semestre |
N�o |
MEN 6 |
Exclusivo at� 4� m�s - ap�s, misto |
1 m�s |
9 meses |
7� |
Todas do semestre |
N�o |
MEN= Mulher-estudante-nutriz; AM= Aleitamento Materno.
Fonte: Relat�rio de pesquisa, 2017.
A Figura 1 faz a representa��o da constitui��o das fam�lias definidas pelas mulheres-estudantes-nutrizes, a partir dos genogramas.
Figura 1: Genogramas das fam�lias participantes do estudo.
Fonte: elaborado pelas autoras, 2017.
Cabe ainda mencionar que na fam�lia 1, enquanto a mulher-estudante-nutriz estava em est�gio curricular supervisionado seu filho era cuidado pelo seu companheiro. Percebe-se cumplicidade do casal na divis�o dos cuidados com a crian�a e das tarefas dom�sticas, evidenciando harmonia e aproxima��o entre ambos. Na fam�lia 2, o beb� ficava aos cuidados da av� materna, quando a mulher-estudante-nutriz necessitava se afastar por ocasi�o de seus estudos. J� na fam�lia 3, a av� materna da crian�a dedicava-se aos cuidados do neto, que ficava sob sua responsabilidade quando a mulher-estudante-nutriz precisava ausentar-se para atividades acad�micas; ela cuidava tamb�m dos afazeres dom�sticos em sua casa. Para a fam�lia 4, tamb�m era a av� materna que cuidava do neto enquanto a mulher-estudante-nutriz dedicava-se aos estudos. Al�m disso, ela cuidava do lar e revendia produtos de beleza por cat�logo. E, para a fam�lia 5, egressa, enquanto mulher-estudante-nutriz, contou com a m�e como cuidadora principal da neta, que se dedicava tamb�m aos cuidados da casa, tendo deixado de contribuir no empreendimento familiar ap�s o nascimento da crian�a. Por fim, na fam�lia 6, a av� paterna, professora universit�ria, auxiliava nos cuidados ao neto, mas os cuidados principais eram realizados pela pr�pria m�e quando esta frequentava a universidade. O ex-marido, pai da crian�a, que residia em outra cidade, foi citado, pela mulher-estudante-nutriz, como importante para ter conseguido estudar e amamentar.
A partir das unidades de registro, selecionadas por semelhan�a de significado e sentido entre si, elaborou-se a categoria anal�tica que trata da reorganiza��o da din�mica da fam�lia em apoio � decis�o da mulher em dar continuidade aos estudos amamentando seu beb�.
Entre os livros e o beb�: reorganiza��o da din�mica familiar em apoio � estudante-nutriz-universit�ria
As reorganiza��es na din�mica das fam�lias deste estudo mostraram-se singulares, considerando-se que cada uma tem suas particularidades na forma de compreender e vivenciar o cotidiano quando do nascimento de um beb�. Contudo, apresentam semelhan�as entre si, visto que os membros da fam�lia empreenderam adequa��es em suas rotinas pessoais e coletivas na depend�ncia da interpreta��o dada �s necessidades da mulher que amamenta quando do seu retorno � rotina acad�mica.
As mudan�as transcendem as viv�ncias intrafamiliares, refletindo-se tamb�m no cen�rio externo � fam�lia propriamente dita. Alguns dos companheiros dessas mulheres-�ndices articularam estrat�gias no mundo do trabalho para que pudessem conciliar com as necessidades da vida pessoal que foi transformada pela chegada da crian�a e com a decis�o de que a mulher-estudante-nutriz deveria dar continuidade aos estudos. Nessa l�gica, esses homens, por vezes, utilizaram-se do per�odo de f�rias e de eventuais redu��es de carga hor�ria para cuidar do beb� na aus�ncia da m�e-estudante.
Adiei minhas f�rias para, no momento que ela voltasse a estudar, eu pudesse ficar com a nen� em casa. [C�F1]
Nessa perspectiva, em uma das fam�lias, o companheiro responsabilizava-se por levar o beb� ao ambiente de estudos da m�e para ser amamentado, o que inclu�a locais de atividades pr�ticas e est�gios desenvolvidos em v�rios pontos da rede de aten��o � sa�de, at� o hospital.
Quando eu estava de est�gio, era ele que levava ela para mamar. Quando eu n�o vinha, ele a levava. E tinha a rotina, hor�rio certo: nove horas batia l� no est�gio. [MEN-F1]
Outro recurso, n�o sistem�tico, de reorganiza��o familiar constitui-se em a mulher-�ndice levar o beb� para a institui��o de ensino, para poder cuid�-lo e amament�-lo.
Teve umas vezes que eu o levei na faculdade. Era beb�, porque da� eles n�o incomodam. Por vezes, meu marido tinha que trabalhar, a m�e tinha um compromisso, da� ele ia junto comigo, s� que tirava um pouco a concentra��o dos colegas (risos). [MEN�F2]
H� tamb�m transforma��es econ�mico-financeiras, pois, com a chegada do beb� alguns decidiram pela contrata��o de algu�m para auxiliar nas tarefas dom�sticas, o que contribuiu na libera��o da av� para o cuidado do neto, refor�ando a possibilidade de a fam�lia apoiar � mulher na decis�o de dar continuidade aos estudos universit�rios.
Mudamos! Quando ele ficou maiorzinho pegamos uma cozinheira, uma mulher para limpar a casa, para eu cuidar dele, porque o meu genro trabalha de manh� e da� eu que fico com ele. Eu e o tio. Passamos envolvidos com ele. [AM♀�F2]
Aqui em casa era todo mundo se unindo. E o pai passou a pagar uma funcion�ria para ajudar a m�e (risos). O beb� fez uma reviravolta aqui. [MEN � F2]
Na casa tem a empregada que faz todo o servi�o, mas, mesmo assim, mudou o servi�o at� com a empregada, porque aumentou o trabalho dela. [MEN�F5]
Para as fam�lias que n�o contam com uma empregada dom�stica, as atividades rotineiras da casa recaem sobre o cuidador do beb�, o que representa certa sobrecarga sobre esse membro do n�cleo familiar, apesar dos rearranjos realizados.
Eu fazia todo o servi�o: lavava, passava, cozinhava e cuidava do beb�. [AM♀�F3]
A m�e fazia todo o servi�o de rua da empresa, mas com a chegada do nen� passou a n�o fazer mais. Com isso, sobrecarregou meu pai, que, al�m de fazer toda a administra��o da empresa, ainda tinha que fazer todo o servi�o de banco e algumas entregas. [MEN�F5]
Al�m das av�s e dos companheiros, outros membros da fam�lia, como os tios e o av�, participaram do cuidado ao beb�, desempenhando atividades que n�o faziam anteriormente.
At� o tio, meu irm�o mais novo, ajudou muito. Na faculdade eu pensava: �Ser� que o nen� est� dormindo? Ser� que n�o est� chorando?� A� eu mandava mensagem pelo celular perguntando e ele me mandava foto do meu filho dormindo, enquanto meu irm�o ficava sentado ao lado, cuidando dele. [MEN-F2]
A minha filha, tia do beb�, mora perto aqui de casa. Ficou mais tranquilo, porque ela tamb�m cuidava do nen� quando precisava (AP♀ � F6).
O av� tamb�m ajudava cuidar. Quando eu tinha roupa para lavar, ele ficava atendendo o nen�, brincava com ele, ficava balan�ando o neto; �s vezes, o beb� at� dormia. [AM♀�F3]
Os dados revelam que as fam�lias valoram tanto a continuidade dos estudos como o bem-estar da crian�a representado pelo aleitamento materno, o que as mobiliza para reorganiza��o de sua din�mica. A partir dessa l�gica, as atribui��es, que comumente s�o desempenhadas pela m�e do lactente, s�o delegadas a outros membros do n�cleo familiar, como se v� nas manifesta��es a seguir.
Me dediquei 24 horas por dia cuidando direto dos dois. [AM♀-F4]
Passei a ser a m�e da minha neta, pois minha filha tinha que estudar. [AM♀-F5]
A gente sabe da import�ncia da amamenta��o na fase inicial da crian�a, ent�o incentivamos para que ela amamentasse, apesar das dificuldades: ir para a faculdade, voltar, �s vezes chegar atrasada. Demos a maior for�a. Era importante para nosso netinho. [AP♂�F2]
Desde quando ela engravidou n�s sentamos e conversamos. Perguntei: �voc� vai parar ou voc� vai continuar?�. Ela respondeu: �Vou continuar�. Respondi: �se voc� vai continuar, vou te apoiar�. [C�F1]
Ela tentou desistir umas duas ou tr�s vezes da faculdade, mas n�o deixei. A gente sempre deu for�a para ela. Ela amamentou sete meses por minha causa, sen�o ela desistia. [C�F2]
Por outro lado, em uma das fam�lias, em que as c�licas do beb� foram interpretadas como um agravo � sua sa�de, o bem-estar da crian�a sobrepujou o valor � continuidade da gradua��o. Esta interpreta��o repercutiu na din�mica familiar, com a av� da crian�a decidindo pelo afastamento tempor�rio de sua filha das atividades acad�micas. Esse beb� foi amamentado exclusivamente at� o sexto m�s de vida e com dois anos de vida ainda estava em aleitamento materno.
Achei essencial que ele fosse amamentado, n�o s� para ela ter o afeto com o bebezinho, mas tamb�m para sa�de dele. Ele teve c�lica at� tr�s meses, sofreu, achei melhor trancar a faculdade para ter o momento com ele. Ele precisava de mais cuidado. Era o melhor rem�dio tamb�m e n�o ia se adaptar com qualquer leite. Mamou, ainda mama. [AM♀-F4]
Por fim, em uma das fam�lias, as experi�ncias pr�vias negativas da mulher-estudante-nutriz relativas ao aleitamento materno comprometeram a fam�lia no sentido de apoi�-la em sua decis�o de amamentar o filho mais novo. Isto, portanto, colocou-se como motivo suficiente para a reorganiza��o familiar em prol do aleitamento materno, respeitando a decis�o da mulher �ndice em continuar seus estudos.
Eu sabia da import�ncia, porque no meu primeiro filho eu amamentei s� quinze dias, ent�o eu queria amamentar mais tempo este beb�. [MEN�F2]
Esta categoria tem�tica indica a import�ncia de que as particularidades de cada fam�lia sejam reconhecidas. Outrossim, interven��es de enfermagem podem ser espec�ficas e singulares, conforme suas mudan�as e rearranjos, seus anseios e necessidades, a todos os membros do sistema familiar e da fam�lia como um todo de modo a consider�-la um n�cleo que desenvolve cuidados, contudo, precisa de compreens�o, respeito e apoio.
DISCUSS�O
A chegada de um novo membro � fam�lia causa transforma��es em sua din�mica. Toda mudan�a gera nas pessoas e nos n�cleos familiares sentimentos e sensa��es que, como em uma gangorra, transitam entre baixos e altos. Com rela��o aos �baixos�, esses se associam, dentre outros motivos, com o temor ao desconhecido e o estresse gerado pelos desajustes que levam aos rearranjos. Quanto aos �altos�, dessa alegoria, esses se referem, dentre outros fatores, � satisfa��o da retomada do equil�brio ap�s a crise e/ou � harmonia reestabelecida no n�cleo familiar. Por isso, mesmo com semelhan�as entre si, cada fam�lia tem uma forma espec�fica de se organizar diante das mudan�as exigidas no processo do nascimento. Essas especificidades s�o moduladas de acordo com os princ�pios, as viv�ncias pr�vias e as cren�as de cada unidade familiar, influenciadas por m�ltiplos saberes que comp�em o contexto cultural em que se inserem e, por isso, a torna uma unidade de cuidado singular.
Destaca-se a distin��o entre �desenvolvimento da fam�lia� e �ciclo vital da fam�lia�. O primeiro enfatiza a trajet�ria �nica constru�da por cada n�cleo familiar e � modelado por acontecimentos previs�veis e imprevis�veis, como doen�as, cat�strofes e tend�ncias da sociedade. J� o segundo se refere �s trajet�rias t�picas da maioria dos n�cleos familiares, como as �entradas� e �sa�das� de membros da fam�lia (nascimentos, sa�da de filhos de casa e �bitos). Esses eventos no ciclo vital das fam�lias geram mudan�as que concorrem para que essas reorganizem seus pap�is e suas regras.2 Tal observa��o foi constatada neste estudo, na medida em que a decis�o da mulher-estudante-nutriz de amamentar e dar continuidade aos estudos repercute de forma significativa na fam�lia, alterando sua rotina e modificando a sua organiza��o.
Contudo, identifica-se que a av� materna � o componente familiar que tem sua rotina mais modificada para dar suporte � mulher-estudante-nutriz, o que se assemelha aos achados de estudo em que as nutrizes tenderam a procurar ajuda para a resolu��o de suas problem�ticas, primariamente, junto a familiares do sexo feminino, visto que estas s�o a refer�ncia na sua rede social e s�o vistas como sujeitos experientes.7 Os rearranjos familiares, que atingem principalmente a m�e da mulher-estudante-nutriz, podem ser justificados, dentre outros fatores que s�o trazidos mais adiante nesta discuss�o, porque a amamenta��o � aprendida e transmitida de m�es para filhas, a partir do compartilhamento de experi�ncias, as quais, muitas vezes, contribuem para empoderar a nutriz. Nessa perspectiva, quando a experi�ncia das av�s � reconhecida, pela mulher gr�vida ou nutriz, como positiva, elas tornam-se refer�ncia para suas filhas, orientando-as e influenciando-as.3, 7,12
Por outro lado, na medida em que h� casos em que as av�s afirmam dedicar-se exclusivamente aos cuidados do neto, os dados indicam que elas podem tomar, para si, atribui��es que s�o cuidados maternos, o que pode levar � confus�o de pap�is dentro do n�cleo familiar. Diante disso, percebe-se a necessidade de o enfermeiro, em conjunto com as fam�lias, tecer reflex�es sobre os sentidos e os significados de a av� �tornar-se m�e de seu neto�. Essa transfer�ncia de responsabilidades para as av�s do beb� leva a uma modifica��o nos limites dos membros de uma fam�lia, os quais dizem respeito �s regras para garantir a diferencia��o deles dentro de um sistema familiar, ou seja, representam o que � atribui��o de cada indiv�duo que comp�e esse n�cleo.
Salienta-se que esses limites podem ser difusos (quando h� a diminui��o das diferen�as entre os componentes do sistema familiar, com esses tornando-se muito �ntimos e, com isso, perdendo a autonomia e a individualidade), r�gidos (quando as decis�es s�o definidas por um ou dois membros e s�o acatadas por todos sem possibilidade de questionamento ou de diverg�ncias, o que gera uma tend�ncia do n�cleo � separa��o) ou perme�veis (existe uma adequada flexibilidade, na qual existem regras pass�veis de modifica��es). Esses limites t�m tend�ncia � mudan�a com o decorrer do tempo e podem tornar-se imprecisos frente a altera��es na din�mica das fam�lias, tais como no nascimento ou por ocasi�o do �bito de familiares.2
As transi��es relatadas pelas av�s maternas neste estudo podem representar uma das fases na reorganiza��o da fam�lia, na qual os limites s�o amb�guos e mant�m-se em altern�ncia, quando a mulher-estudante-nutriz permite que os limites de sua rela��o com o seu beb� tornem-se perme�veis, para que a av� materna possa penetrar na intera��o do bin�mio m�e-filho e �modificar as regras� da organiza��o familiar, atribuindo a si as tarefas que seriam destinadas � mulher que acaba de se tornar m�e daquela crian�a. Por outro lado, embora seja comum em alguns segmentos sociais a av� envolver-se com os cuidados dos netos, at� mesmo cri�-los, h� situa��es em que isto pode gerar conflitos intrafamiliares. Nesses casos pode haver desentendimentos com os genitores da crian�a, falta de interesse dos pais no cuidado ao beb�, ou uma insatisfa��o das av�s por terem que assumir as atribui��es de m�e e n�o conseguirem dedicar-se aos seus netos de outra forma, devido � sua responsabilidade pela educa��o.13
Constitui-se desafio para a enfermagem identificar essas rela��es conflituosas, buscando a necess�ria interlocu��o com as fam�lias que atravessam essa fase para juntos, definirem os caminhos que possam minimizar tais situa��es. Cabe lembrar que as unidades familiares vivem, inevitavelmente, momentos dif�ceis que exigem delas agir, sentir e pensar, o que, por vezes, ultrapassa as suas capacidades conhecidas at� ent�o. Diante disso, faz-se necess�rio que os enfermeiros sejam capazes de acessar e compreender esse universo invis�vel do mundo privado e singular das fam�lias e, em seu cotidiano profissional, empreendam esfor�os para que as fragilidades percebidas possam ser significadas como oportunidades para fortalecimento da fam�lia e possibilidade de resolu��o de seus conflitos.14
Nesta investiga��o, a figura paterna, diferentemente de estudo j� citado, teve destaque na rede social de apoio � nutriz, sendo mencionado como um pilar no incentivo ao aleitamento materno.3 O retorno da mulher-estudante-nutriz �s atividades acad�micas parece ter contribu�do para fortalecer os la�os do casal na busca do que seria o ideal para a sua fam�lia, al�m de constituir-se em dispositivo que auxilia o homem a materializar a experi�ncia de tornar-se pai. Al�m disso, na medida em que a mulher permite a participa��o mais significativa do pai no cuidado ao filho, menor ser� a sua sobrecarga e maior a cumplicidade da tr�ade m�e-pai-crian�a.
Ainda, cabe tecer reflex�es acerca da inser��o do homem-pai nos cuidados relativos � crian�a, o que tem se tornado uma realidade, se contrapondo � sua participa��o em outras tarefas no �mbito dom�stico, onde ele ainda tem participa��o incipiente. A despeito das transforma��es e ressignifica��es das rela��es entre homens e mulheres atualmente, essas se mostram como um processo a ser consolidado. � necess�ria uma �desconstru��o� da enraizada cultura de g�nero, visto que as tradicionais divis�es de pap�is ainda resistem. Para isso, as fam�lias precisam ser instigadas a questionar e rever suas pr�prias rela��es e intera��es no grupo familiar, o que poder� repercutir em redefini��o de pap�is no interior desse n�cleo.15-16
Percebe-se, tamb�m, que a enfermagem tem muito o que aprender com essas fam�lias, que se rearranjam para dar suporte � mulher-estudante-nutriz, redistribuindo as tarefas, a fim de que o grupo familiar, como um todo, e cada um de seus componentes, se reequilibrem. A partir desse entendimento, ressalta-se que, para agir de forma colaborativa com as fam�lias, � necess�rio o desenvolvimento de uma base de conhecimentos que envolva a promo��o e o fortalecimento da sa�de da fam�lia nos n�veis relacional e sist�mico, especialmente a partir da compreens�o do funcionamento do sistema de sa�de da fam�lia,17 como se apresenta neste estudo.
Ainda no que tange �s reorganiza��es familiares, outros componentes, tais como tia e av� materno da crian�a, tamb�m s�o mencionados nesta investiga��o. Percebe-se que esses se configuram como suporte aos cuidadores principais, representados pelos companheiros e as av�s. Nessa l�gica, esses membros do grupo familiar os substituem quando precisam ausentar-se por alguns momentos ocasionais. Contudo, destaca-se que entre as fam�lias estudadas n�o houve uma prefer�ncia, dentre esses substitutos, por pessoas do sexo feminino, como destacado em outros estudos que, a partir de uma perspectiva de g�nero problematizam a naturaliza��o e essencializa��o do cuidado como tarefa do universo feminino.16,18-19
Especificamente acerca do recurso de trancamento da matr�cula por um ano, percebe-se que, na assun��o da maternidade, a mulher � levada a renunciar a algumas coisas que lhes s�o caras e importantes, como nesse caso, os estudos. Esse seria o �pre�o� da op��o pela vida adulta, que se transforma com a chegada de um beb�.
A sobreposi��o do papel materno � realiza��o profissional constatada neste estudo parece corroborar o argumento de que dentre as capilaridades de pap�is que se apresentam para a mulher atualmente, a maternidade ainda representa um papel, no imagin�rio social como uma condi��o do feminino que durante muito tempo coube �s mulheres e foi constru�da pelos valores partilhados na sociedade, criando o mito do instinto materno.20 O discurso de que a mulher deve abdicar de seus estudos para cuidar do beb� refor�a um padr�o cultural em supera��o para algumas fam�lias, mas ainda vigente, ou seja, de que os cuidados dos filhos, com vistas � preserva��o de sua sa�de e bem-estar, s�o atribui��es exclusivamente da mulher-m�e. Esse padr�o pode representar um fardo que se mant�m sobre os ombros de algumas mulheres, na medida em que abdicam de alguns planos que est�o para al�m da maternidade. Refor�a-se, assim, a necessidade de perceber-se, na enfermagem de fam�lia, que as rela��es intrafamiliares s�o permeadas por quest�es culturais e, em consequ�ncia, de g�nero, as quais modulam a din�mica familiar e ao mesmo tempo s�o moduladas por elas.
Neste estudo, identificaram-se pr�ticas adotadas pelo n�cleo familiar para garantir o aleitamento materno do beb�, que, nesse contexto social e hist�rico, simboliza carinho, afeto, aproxima��o, confian�a, seguran�a para a crian�a e v�nculo entre m�e e filho.21 Tais pr�ticas configuram-se em adapta��es que a fam�lia realiza em suas rotinas, em reconfigura��es de papeis, para possibilitar, dentre outros objetivos, que esse simbolismo tome concretude sem ferir os planos de realiza��o profissional da mulher-estudante-nutriz que d� continuidade aos estudos. Ao apoi�-la em sua decis�o, a fam�lia garante, tamb�m, a estabilidade familiar.
Essa tentativa de manter-se est�vel agrega no contexto das fam�lias um significado complexo, pois se refere a um processo de autorregula��o que se d� mediante situa��es que desorganizam sua din�mica e, em consequ�ncia, requerem uma reorganiza��o do sistema familiar em busca do equil�brio. Sendo assim, as fam�lias deste estudo buscam, por meio de suas reorganiza��es individuais (de cada membro) e coletivas (a fam�lia como um todo) a homeostasia do sistema familiar, viabilizando o retorno da mulher-estudante-nutriz �s aulas e o aleitamento materno da crian�a, concomitantemente.
Da reflex�o sobre os resultados deste estudo, apreende-se que as pr�ticas de cuidado dirigidas �s fam�lias precisam ser orientadas pela compreens�o de que atualmente �o desejo de ter filhos costuma entrar em conflito com outros imperativos da vida da mulher como, por exemplo, com o trabalho. � preciso considerar que existem �tantas mulheres quantos desejos� [...] que h� n�s paradoxais entre os repert�rios discursivos da maternidade e a forma como cada mulher vivencia este processo. [...] h� uma tens�o entre o que o meio social, hist�rico e cultural determina, e a viv�ncia subjetiva de cada mulher a respeito da maternidade�.19:189 H�, o entendimento de que fam�lias tensionadas que precisar�o de cuidados para avan�arem em dire��o � constru��o e conquista de um mundo permeado por rela��es justas e igualit�rias.
Em �mbito institucional, foi aprovada a Pol�tica de Igualdade de G�nero da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), institu�da pela Resolu��o n� 064, de 03/11/2021, que em seu Art. 29, � 3�, inciso V, garante o direito de amamenta��o livre em qualquer espa�o da UFSM, dentre outros recursos que favore�am ambi�ncia adequada para sua pr�tica.22�
Destaca-se como limita��o da pesquisa o fato de ter sido desenvolvida com estudantes de enfermagem pertencentes a uma �nica institui��o de ensino, o que pode limitar a compreens�o das viv�ncias de outras fam�lias. Vale destacar que a escolha por estudantes de gradua��o em enfermagem se deve � vincula��o de uma das autoras a esse curso e o fato de ela estar amamentando nesse per�odo. Associado a isso, a inexist�ncia de um espa�o institucional para dar suporte a essas estudantes nutrizes que acabavam sendo acolhidas e auxiliadas por docentes e colegas, de maneira informal.
Cabe salientar que, na literatura nacional, h� escassez de estudos cient�ficos que relacionem a amamenta��o com a continuidade dos estudos universit�rios, principalmente quando articulados com as repercuss�es na din�mica familiar em raz�o do processo do aleitamento.
CONSIDERA��ES FINAIS
Os resultados do estudo asseveram que, em cada n�cleo familiar, as mudan�as em sua din�mica envolvem diversas interfaces da vida de seus membros. Dentre as transforma��es destacam-se as relativas ao emprego formal dos companheiros, a reorganiza��o do cotidiano da av� materna que toma para si, em parte significativa das fam�lias, o cuidado do neto e, em algumas situa��es, assume tamb�m as tarefas dom�sticas da casa da filha, enquanto ela se dedica �s atividades acad�micas. A contrata��o de uma empregada dom�stica emerge como uma alternativa em algumas fam�lias, cabendo aos familiares os cuidados � crian�a.
Referente �s raz�es para as mudan�as na din�mica familiar, sobressaem-se os benef�cios da amamenta��o � sa�de da crian�a, com destaque a valoriza��o do v�nculo entre m�e e filho, e as experi�ncias pr�vias da fam�lia em rela��o � amamenta��o. Esses s�o aspectos que comp�em a cultura familiar e, como tal, orientam cada um dos seus componentes e a fam�lia como um todo para rearranjos que permitam apoiar a nutriz em suas decis�es, neste caso em espec�fico, seguir estudando e amamentando.
Os resultados deste estudo contribuem para dar visibilidade a uma problem�tica bastante comum dentro dos espa�os das institui��es de ensino superior, em especial dos cursos de enfermagem, podendo servir de subs�dio para que pol�ticas ou, pelo menos, estrat�gias institucionais sejam pensadas e discutidas, no �mbito das universidades, visando o incentivo ao aleitamento materno e garantia dos direitos de m�es-estudantes. Al�m disso, esses resultados sinalizam para a import�ncia de os profissionais de sa�de, sobretudo os da aten��o prim�ria em sa�de, dentre eles os enfermeiros, se aproximarem dessas fam�lias considerando-as como n�cleos de cuidado.
Quanto � an�lise dos resultados, cabe salientar que, na literatura nacional, h� escassez de estudos cient�ficos que relacionem a amamenta��o com a continuidade dos estudos universit�rios, principalmente quando articulados com as repercuss�es na din�mica familiar em raz�o do processo do aleitamento, o que representa um limitador para a discuss�o.
A enfermagem de fam�lia � um campo a ser mais bem explorado nos cursos de gradua��o em Enfermagem, em raz�o das diferentes conforma��es familiares e, tamb�m, pela forte influ�ncia da cultura familiar nas escolhas de sa�de dos sujeitos e seus grupos sociais. Assim, �pensar na fam�lia�, elencando-a como unidade de cuidado, dentro de um modelo de aten��o voltado � integralidade dos sujeitos, que dialoga com aspectos sociais, culturais, pol�ticos e com quest�es de g�nero, pode transformar a realidade de muitos sistemas familiares que aceitam o desafio de apoiar um dos seus membros que se decide por estudar e amamentar ao mesmo tempo.
Por fim, sugere-se que sejam realizados investimentos para contribuir na promo��o do aleitamento materno, especialmente esfor�os para acolher mulheres-estudantes-nutrizes e encoraj�-las a manter a amamenta��o ap�s a retomada dos estudos universit�rios. Destarte, pesquisas com estudantes nutrizes de diferentes cursos de gradua��o podem contribuir para discuss�es nas institui��es de ensino superior no sentido de se projetar estrat�gias de suporte a elas. Tais a��es poder�o contribuir para que elas mantenham a amamenta��o e o cuidado com o beb� e continuem seus estudos.
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Recebido em: 02/02/2022
Aceito em: 19/12/2022
Publicado em: 28/12/2022
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Como citar: Van der Sand ICP, Cabral FB, Girardon-Perlini NMO, Hildebrandt LM, Silveira A, Massariol AM. Entre os livros e o beb�: reorganiza��o familiar em apoio � nutriz-estudante universit�ria. J. nurs. health. 2022;12(3):e2212322329. DOI: https://doi.org/10.15210/jonah.v12i3.4647