ARTIGO ORIGINAL

Percepções de pacientes com doença renal crônica sobre tratamento de hemodiálise e assistência de enfermagem

Perceptions of chronic renal patients about hemodialysis treatment and nursing care

Percepciones de pacientes renales crónicos sobre el tratamiento de hemodiálisis y los cuidados de enfermería

Pereira, Lara Terezinha Cunha;[1] Ferreira, Marilaine Matos de Menezes[2]

RESUMO

Objetivo: descrever percepções do paciente com doença renal crônica sobre tratamento de hemodiálise e assistência de enfermagem. Método: pesquisa qualitativa realizada com 20 pacientes, com 18 anos ou mais de idade, diagnóstico confirmado de doença renal crônica e tratamento regular de hemodiálise, através de entrevistas semiestruturadas, no período 17 a 20 de maio de 2021. Os dados foram tratados por análise de conteúdo. Resultados: houve déficit de conhecimento dos participantes acerca da doença e do tratamento de hemodiálise e das dificuldades vivenciadas como influenciadoras no enfrentamento da doença. Consideram a assistência de enfermagem de boa qualidade, porém não usufruem de uma boa educação em saúde por parte da equipe. Conclusões: a educação em saúde não foi realizada sistematicamente durante a assistência de enfermagem. Essa carência pode acarretar dificuldades no tratamento de hemodiálise e afetar a percepção do indivíduo sobre seu processo de saúde e doença e qualidade de vida. 

Descritores: Insuficiência renal crônica; Diálise renal; Assistência centrada no paciente; Cuidados de enfermagem; Pesquisa qualitativa

ABSTRACT

Objective: to describe the perceptions of patients with chronic kidney disease about hemodialysis treatment and nursing care. Method: qualitative research conducted with 20 patients, aged 18 years or older, confirmed diagnosis of chronic kidney disease and regular hemodialysis treatment, through semi-structured interviews, from May 17 to 20, 2021. Data were processed by analysis of content. Results: there was a lack of knowledge of the participants about the disease and hemodialysis treatment and the difficulties experienced as influencers in coping with the disease. They consider the nursing care to be of decent quality, but they do not enjoy good health education from the team. Conclusions: health education was not performed systematically during nursing care. This lack can lead to difficulties in hemodialysis treatment and affect the individual's belief of their health and disease process and quality of life.

Descriptors: Renal insufficiency, chronic; Renal dialysis; Patient-centered care; Nursing care; Qualitative research

RESUMEN

Objetivo: describir percepciones de pacientes con enfermedad renal crónica sobre tratamiento de hemodiálisis y cuidados de enfermería. Método: investigación cualitativa realizada con 20 pacientes, con edad igual o superior a 18 años, diagnóstico confirmado de enfermedad renal crónica y tratamiento regular de hemodiálisis, a través de entrevista semiestructurada, del 17 al 20 de mayo de 2021. El análisis fue de contenido. Resultados: hubo desconocimiento de los participantes sobre la enfermedad y el tratamiento de hemodiálisis y las dificultades experimentadas como influenciadores en el enfrentamiento de la enfermedad. Consideran que los cuidados de enfermería son de calidad aceptable, pero no disfrutan de una buena educación en salud por parte del equipo. Conclusiones: no se realizó educación en salud sistemáticamente durante la atención de enfermería. Esa carencia puede generar dificultades en el tratamiento de hemodiálisis y afectar la percepción del individuo sobre su proceso de salud y enfermedad y calidad de vida.

Descriptores: Insuficiencia renal crónica; Diálisis renal; Atención dirigida al paciente; Cuidado de enfermera; Investigación cualitativa

INTRODUÇÃO

De acordo com as diretrizes da Kidney Disease: Improving Global Outcomes (KDIGO), a Doença Renal Crônica (DRC) é caracterizada como a perda progressiva da função renal e definida pela excreção persistente e elevada de albumina na urina (30 mg/g ou 3 mg/mmol de creatinina), redução persistente estimada da Taxa de Filtração Glomerular (TFG) < 60ml/min/1,73m², ou ambos, por mais de três meses. Segundo a classificação KDIGO, existem 5 estágios da doença e o último é caracterizado por uma TFG < 15ml/min/1,73m² com os candidatos a uma Terapia Renal Substitutiva (TRS).

De acordo com o Censo Brasileiro de Diálise, um estudo comparativo entre os anos de 2009 e 2018, houve um aumento de 54,1% novos pacientes em diálise em relação a 2009. Com relação ao tipo de terapia dialítica, a hemodiálise continua sendo predominante com 92% dos pacientes, um aumento de 3% em relação à década anterior. Já em relação à diálise peritoneal, houve uma redução de 10,5% para 7,8%, em 2009 e 2018, respectivamente, de pacientes submetidos a essa terapia. Dentre os pacientes em diálise, 22,1% se encontravam em fila de transplante renal.2

A hemodiálise consiste na remoção de substâncias tóxicas e líquidos em excesso no organismo, cuja duração leva de duas a quatro horas, necessitando que o paciente se desloque para a unidade de diálise de duas a quatro vezes por semana para realizar esse procedimento.3 A experiência de receber a notícia de que será necessário realizar o tratamento hemodialítico é vivenciada de forma negativa e dolorosa. Apesar da hemodiálise impactar, na maioria das vezes, na melhora do quadro clínico do paciente renal, a percepção do mesmo sobre ela ainda é negativa, pois traz sofrimento, angústia e medo.4

Além disso, o sentimento de negação se apresenta como uma barreira para algumas pessoas, por não compreenderem a magnitude e complexidade da doença, acabam vivenciando essa experiência de forma negativa e desconhecida, necessitando de um maior acolhimento profissional com acompanhamento de suas necessidades reais e esclarecimento sobre seu processo de saúde.5

Diante do quadro clínico do paciente renal crônico submetido à hemodiálise e considerando que boa parte do seu tempo vivido é dentro da unidade de diálise, cabe aos profissionais de saúde a identificação e tratamento dos eventos decorrentes da terapia hemodialítica. O conhecimento acerca da percepção de cada paciente permite a implantação de métodos assistenciais que visem atender melhor às suas necessidades.6

Ante o exposto, é relevante para as práticas de saúde discutir sobre a qualidade da assistência de enfermagem prestada aos pacientes com DRC, em tratamento de hemodiálise, através da percepção do paciente assistido. O conhecimento sobre a percepção do paciente é de suma importância para a melhoria da assistência de enfermagem voltada à prestação de serviços, que vise contribuir com um tratamento digno e adequado para essas pessoas.

Portanto, o presente estudo teve por objetivo descrever percepções do paciente com doença renal crônica sobre tratamento de hemodiálise e assistência de enfermagem. Considerando que a concepção do paciente sobre seu processo de saúde e doença e as dificuldades relacionadas à adesão ao tratamento contribuem para construção da percepção do indivíduo sobre a assistência de saúde, o estudo trouxe de forma específica contribuições sobre o assunto com ênfase na assistência de enfermagem.

MATERIAIS E MÉTODO

Trata-se de uma pesquisa qualitativa, descritiva e exploratória. A investigação foi desenvolvida em uma unidade de diálise de um hospital estadual de Salvador-Bahia (BA) que disponibiliza o tratamento hemodialítico para adultos. No período da coleta de dados, entre 17 e 20 de maio de 2021, havia o registro de 162 pacientes em tratamento na unidade de diálise. Os critérios de inclusão para seleção da amostra foram pacientes com idade maior ou igual a 18 anos, com diagnóstico confirmado de DRC e que estivessem em tratamento regular (maior que três meses) de hemodiálise na instituição. A amostra da pesquisa foi composta por 20 pacientes adultos entre 18 e 73 anos, com diagnóstico confirmado de DRC, em hemodiálise há mais de três meses na instituição. O encerramento da coleta de dados baseou-se na saturação teórica das respostas fornecidas.7

Não houve abandono do tratamento, transferências para outra unidade, falecimentos ou recusas para responder o questionário completo durante a coleta de dados que justificassem a exclusão de pacientes da pesquisa. A coleta foi realizada presencialmente por uma das autoras, capacitada, com bacharel em enfermagem, utilizando uma linguagem acessível e compatível com o grau de formação dos participantes. A entrevistadora se identificou e apresentou os objetivos da pesquisa antes da realização da entrevista.

A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas semiestruturadas, contendo variáveis que se direcionam ao perfil dos pacientes e a sua percepção sobre a assistência de enfermagem, com realização durante o procedimento de hemodiálise na unidade de tratamento, através de um instrumento confeccionado pelas autoras que abordou: o perfil sociodemográfico (gênero, idade, escolaridade, renda e moradia); saúde (16 perguntas sobre a doença, o tratamento hemodialítico, o acesso à unidade de tratamento e a assistência de enfermagem no tratamento hemodialítico).

Devido às condições pandêmicas relacionadas à Coronavirus Disease 2019 (Covid-19) que perduravam no período da coleta de dados, as entrevistas foram realizadas durante o procedimento de hemodiálise, individualmente, respeitando as medidas de distanciamento, higiene das mãos com álcool a 70% e com o uso adequado de máscaras de proteção, tanto a pesquisadora, quanto o paciente entrevistado. As estratégias realizadas para coleta de dados visaram a garantia da confidencialidade e a privacidade dos participantes, assim como a segurança do paciente contra a Covid-19.

As entrevistas foram realizadas de forma individual com pessoas adultas em tratamento de hemodiálise, que se enquadraram nos critérios estabelecidos, as quais foram identificadas na pesquisa por códigos alfanuméricos (L01 a L20). O instrumento utilizado serviu apenas como guia para a coleta de dados, sendo necessário um gravador e que a pesquisadora utilizasse de uma escuta ativa para interpretação fidedigna das informações obtidas e posteriormente documentá-las para a pesquisa. Cada entrevista durou em média de dez a 15 minutos. 

Os dados obtidos foram tratados por meio do método de análise de conteúdo,8 seguindo suas três fases: pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados, inferência e interpretação. As informações foram interpretadas e classificadas em três categorias.

A pesquisa obedeceu a Resolução n°466/2012 no Conselho Nacional de Saúde, submetida à aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) sob o número 4.023.678. A coleta de dados somente iniciou após a aprovação do projeto pelo CEP e a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido pelos participantes, conforme a disponibilidade dos mesmos e da unidade de hemodiálise.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Dentre os 20 participantes, 19 residiam no município de Salvador e região metropolitana, todos em zona urbana, a maioria do gênero masculino (n=13). Com idade entre 58 e 65 anos (n=8); com ensino fundamental completo (n=7) e tendo como renda principal, a aposentadoria (n=13). O perfil encontrado relacionado a prevalência do gênero masculino e baixa escolaridade é similar com o de outros estudos encontrados na literatura.9-11

Os outros participantes apresentam as características de: gênero feminino (n=7); faixas etárias de 66 a 73 anos (n=4), 42 a 49 anos (n=3), 18 a 25 anos (n=2), 50 a 57 anos (n=2) e 34 a 41 anos (n=1); escolaridades de ensino médio completo (n=7), ensino médio incompleto (n=2), ensino fundamental incompleto (n=2), ensino superior completo (n=1); e outras rendas (n=5), sustentados(as) por algum familiar (n=1) e bolsa família (n=1).

As três categorias emergidas após a interpretação dos resultados foram: conhecimento de pacientes sobre a doença e o tratamento de hemodiálise; dificuldades vivenciadas pelos pacientes em tratamento de hemodiálise; percepção do paciente sobre a assistência de enfermagem durante o tratamento de hemodiálise.

Conhecimento de pacientes sobre a doença e o tratamento de hemodiálise

A DRC se caracteriza como um grande problema de saúde pública no Brasil, devido a sua alta incidência e as altas taxas de mortalidade.12 A doença compromete a função renal através de lesão renal de forma gradual e irreversível.13

Um dos principais tratamentos para DRC é a hemodiálise, que é realizada por meio da filtração sanguínea através de uma membrana semipermeável, dialisador, no qual ocorrem as trocas dos líquidos, eletrólitos e produtos do metabolismo, entre o sangue e o dialisato, e é um tratamento para a vida toda até que os pacientes sejam submetidos ao transplante renal, se assim desejarem.14-15

O conhecimento acerca do próprio processo de saúde e doença é fundamental para melhoria da qualidade de vida dos pacientes, assim como para aceitação desta condição. Cerca de 50% dos pacientes alegam não saber o que é a DRC e o tratamento de hemodiálise, o que possibilita um questionamento sobre quais informações e de que forma são transmitidas aos pacientes, pois a maioria se encontra em uma faixa etária de 58 a 65 anos com um grau de escolaridade de ensino fundamental completo. Declarações sobre a doença:

Não [sabe sobre a doença]. Eu fui fazer uns exames de rotina e aí a médica me encaminhou para ficar fazendo hemodiálise. Eu estava bem, mas ela disse que eu tinha que vir. (L12)

Não sei, não [sobre a doença]. (L14)

Não tenho certeza [sobre a doença]. (L02)

Devido à doença ser assintomática no início, há uma dificuldade na identificação precoce do diagnóstico, dificultando o manejo do tratamento. Além disso, as alterações decorrentes da diminuição progressiva da taxa de filtração glomerular acarretam comorbidades além da DRC, aumentando a chance de mortalidade precoce.14 Com relação ao tratamento, alguns pacientes afirmam:

Estou aqui fazendo, mas não sei não [sobre o tratamento]. (L12)

Não [sabe sobre o tratamento], eu estou vendo agora que estou fazendo hemodiálise, mas eu nunca tive nada. E me quebrou todo, não consigo andar direito, quase caindo, as pernas estão bambas. (L14)

Dentre os pacientes que afirmam conhecer sobre a doença e o tratamento, a maioria apresenta um grau de escolaridade de ensino médio completo. Outro ponto é a faixa etária bem variada entre 18 e 73 anos. Por conseguinte, pode-se estabelecer uma relação entre o grau de escolaridade e o conhecimento acerca do processo de saúde e doença. Como elucidado em pesquisas anteriores,11,16 a baixa escolaridade pode interferir na realização adequada do tratamento, assim como na qualidade de vida, pelo comprometimento da educação em saúde devido as dificuldades no entendimento das orientações fornecidas pelos profissionais. Declaram sobre a doença:

É o problema dos rins, para [cessa] de funcionar. (L07)

Sei que é a deficiência do rim, o rim deficiente. (L09)

É porque o rim para [cessa] de funcionar. (L13)

E sobre o tratamento:

É um tratamento para tirar as impurezas que o rim trabalhava no lugar e agora quem tira é a máquina. (L07)

Embora estas informações sobre o que é a doença e o tratamento estejam interligadas, alguns pacientes alegam que tem conhecimento sobre a doença e não tem sobre o tratamento ou o inverso. Como exemplos:

Sim [sobre a doença]. Não sei [sobre o tratamento]. (L11)

Não sei. Eu acho que não [sobre a doença]. Sei por que eu estou fazendo, inclusive eu melhorei um pouco, porque eu tinha o problema de pressão [alta] e agora eu não tenho mais, a pressão baixou [sobre o tratamento]. (L16)

Esta contradição também possibilita o questionamento sobre a qualidade das informações passadas para os pacientes, pois estes nem sempre conseguem associar a condição patológica ao tratamento realizado, ainda que tenham consciência de que precisam realizar o tratamento para evitar complicações maiores.

Os profissionais de saúde, principalmente os de enfermagem, devem estar atentos para a comunicação com os pacientes e família, considerando as individualidades e a capacidade de compreensão das informações transmitidas.11

Outra questão é a forma como é interpretada a doença renal crônica e como estes consideram que sabem ou não a respeito da doença. Apesar de alguns pacientes afirmarem que sim, quando questionados apresentam concepções vagas ou inseguras a respeito do que entendem. Como exemplos:

Eu sei que é esse processo aqui que a gente faz para durar mais uns dias [sobre o tratamento]. (L09)

Hoje eu venho para a máquina achando que sei, dessa forma que estou fazendo hoje, mas não sei dizer o que significa nada, não vou mentir para você [sobre o tratamento]. (L20)

Devido às repercussões da doença e por falta de orientação adequada, alguns abandonam o tratamento ou param de se atentar constantemente às condições em que devem se submeter para o equilíbrio do tratamento e do curso da doença. Diante disso, a educação em saúde com o incentivo aos pacientes a adaptarem ao novo estilo de vida é imprescindível para que estes compreendam o papel que deverão desempenhar no controle da doença e de sua vida.17

Dificuldades vivenciadas pelos pacientes em tratamento de hemodiálise

Tratando-se de dificuldades para realização do tratamento de hemodiálise, a maioria dos pacientes alegam que não têm dificuldades. Entre estes, alguns utilizam a Fístula Arteriovenosa (FAV) funcionante ou ainda não utilizaram a FAV e fazem uso do cateter.

Tenho fístula, mas não estou usando ainda. (L16)

Não fiz a fístula ainda não, eu uso cateter. (L20)

Agora com a fístula não, mas quando era no cateter tinha. (L12)

Tenho fístula e graças a Deus está ótima. (L19)

Alguns pacientes relatam que a FAV não funcionou ou que apresentam alguma complicação, também alegam não ter dificuldades, embora em suas falas apresentem condições que dificultam o procedimento de diálise.

Não tenho o que dizer, só que isso aqui incomoda. Ficar levando furada, ninguém gosta. (L05)

Eu fiz a fístula, mas não deu certo. (L18)

Não [sobre ter dificuldades], mas a fístula não funcionou. (L01)

Entre os que dizem ter dificuldades, a maioria relata que não utilizam a fístula por não ter funcionado ou por ter parado de funcionar, sendo necessário a utilização de cateter para a realização da diálise.

Colocou a fístula e ficou quase um ano sem funcionar, tentou em outros lugares, mas não deu certo. Agora que colocou esse cateter aqui, graças a Deus deu certo. (L03)

A fístula parou. (L06)

Eu uso permcath, já fiz a fístula já e no mesmo dia perdeu. (L09)

Eu fiz a fístula e perdi. (L10)

Para a realização da hemodiálise é necessário confeccionar um acesso vascular, geralmente um Cateter Venoso Central (CVC) ou uma FAV. Esta última para ser utilizada necessita de um período inativo para sua maturação, fazendo com que os pacientes com fístula imatura necessitem passar um período utilizando o cateter, por este se tratar de um acesso que permite a utilização de maneira imediata.18

Como via alternativa para realização da hemodiálise, o CVC também é utilizado para pacientes que têm complicações com a fístula e não conseguem utilizá-la, situação de muitos dos participantes da pesquisa, porém, o tempo de permanência de um CVC depende do tipo (de curta permanência ou longa permanência) e do surgimento de complicações associadas a este acesso como: infecções e obstrução do cateter.18

Apesar de a FAV ser o acesso vascular mais indicado, ela também pode apresentar complicações que podem dificultar o tratamento como o surgimento de infecções, trombose, aneurismas, além de redução do fluxo sanguíneo, edema em membro da fístula e aumento da demanda cardíaca. Para prevenir complicações e contribuir para o funcionamento da FAV, o autocuidado precisa der adequado.19

A maioria dos pacientes dizem ter fácil acesso a unidade de diálise, embora aqueles que dizem não ter fácil acesso referem-se à sintomatologia da doença e ao horário disponível para realização do seu tratamento, pois alguns pacientes realizam Tratamento Fora do Domicílio (TFD) e dependem dos horários dos transportes disponibilizados pelas prefeituras:

Eu venho de Uber [aplicativo de compartilhamento de viagem que conecta passageiros com motoristas], porque eu sinto muitas dores nas pernas, venho de Uber por necessidade. (L05)

Por causa do horário, esse horário para voltar é ruim. (L12)

A sintomatologia característica da DRC como inchaço, fadiga, falta de ar, hipertensão, dormência, cãibras e fortes dores nos membros inferiores, dores renais e no abdômen, síncope, vômitos, diarreia, implicam na qualidade de vida e percepção da pessoa com DRC, pois restringe algumas atividades que antes seriam consideradas simples, mas que agora exigem uma atenção maior e auxílio para realizá-las, como o próprio deslocamento para a unidade de diálise.20

Devido o momento de coleta dados coincidir com a pandemia do novo coronavírus (Sars-Cov-2), um paciente também relatou sentir dificuldade para acesso devido as condições pandêmicas:

Antes da pandemia eu vinha de ônibus, agora eu venho de carro. (L09)

A maioria dos pacientes se deslocam de carro e demoram menos de 30 minutos para chegarem à unidade, porém, existe uma parcela quase equivalente que leva entre 60 e 90 minutos nesse deslocamento.

Uma maior parcela dos pacientes declara ter conseguido aderir ao tratamento com facilidade, dentre estes, os que afirmam ter recebido apoio de um profissional alegam que foram de médicas ou médicos, em maioria, e de psicólogas ou psicólogos.

A médica que me acompanha me ajudou. (L03)

Conversando e esclarecendo as coisas, a médica. (L19)

Sim, psicólogo. (L01)

Aqueles que informam não ter conseguido aderir a terapêutica com facilidade, quando se referem a profissionais que contribuíram para que esse processo fosse mais fácil ou participaram do processo, citam médicos e médicas.

Disseram que eu ia ter que dialisar senão eu ia morrer. A gente fica assim meio [...], mas tem que fazer. (L09)

Assim, eu senti mal em 2018, aí fui para UPA [Unidade de Pronto Atendimento] e de lá vim para cá, já para a hemodiálise. Eu fiquei ruim, ruim mesmo, aí a médica disse que eu ia ter que voltar para continuar o tratamento. (L17)

Já L13 acredita que contribuem para que se torne mais fácil essa adesão:

Todos que conversam com a gente. (L03)

A perda de identificação do profissional de enfermagem como educador, orientador e participativo nas medidas de apoio e suporte emocional do paciente durante o tratamento de hemodiálise é um fator importante a ser considerado, já que como membro da equipe multiprofissional deve desempenhar e garantir essa assistência, assim como categoria de enfermagem que deve acompanhar o paciente de perto durante todo o tratamento.

Além disso, é de responsabilidade dos enfermeiros e enfermeiras desenvolverem ações que promovam um maior reconhecimento da profissão, explorando a necessidade dos membros da equipe de enfermagem se identificarem no momento da prestação de cuidados e participarem ativamente da assistência ao paciente.21

As enfermeiras e enfermeiros juntos a equipe de enfermagem são imprescindíveis para aceitação da doença pelo paciente e adesão ao tratamento, por meio de um vínculo estabelecido e um apoio constante, além de um investimento no processo educativo com objetivo de preparar, fortalecer e desenvolver mecanismos para lidar com a nova realidade vivida, principalmente estimulando o autocuidado.11

A maioria daqueles que dizem ter conseguido se adaptar a rotina da diálise de forma fácil, alega que os profissionais de enfermagem contribuem para isso:

Consegui, aceitei facilmente. Sim, aqui é todo mundo maravilhoso. (L19)

Eles são muito bons, não tenho nada o que dizer daqui. (L03)

Sim, não tenho nada contra, é tudo a favor. (L14)

Tem um tratamento legal aqui. (L17)

Apesar de a maioria dos participantes alegarem ter conseguido aderir a rotina com facilidade, alguns destes depoimentos demonstram o contrário:

Eu bebo um pingo de água assim e aí dizem que é muito a água que eu tomo. O café é um pinguinho assim, e os remédios, hoje mesmo eu tomei um, nem botei água, engoli no seco. (L04)

No início foi difícil, depois foi que eu me acostumei mais. (L11)

É chato, mas a gente tem que vir. (L09)

Eu estou me acostumando. (L16)

Aceitei, porque eu preciso fazer. Se eu não vier, eu vou inchar e eu não quero isso, quero minha saúde. (L05)

Dentre os que alegam não ter conseguido aderir de forma fácil, expõe:

Até hoje é muito difícil, eu tinha uma vida muito corrida e agora eu acordo e tenho que vir para o hospital [...]. A gente sabe que todo mundo um dia vai morrer, mas a gente vai morrer mais rápido. Estamos disputando aqui um rim, enquanto trocamos um rim pela máquina. Se a gente não vir, aí vai morrer mais rápido ainda [...]. Sim, todo mundo gente boa [sobre a assistência]. (L20)

As pessoas em tratamento hemodialítico podem permanecer anos submetidos a esta terapia, necessitando comparecer a hospitais ou clínicas especializadas de duas a três vezes por semana, onde permanecem por um período de duas a quatro horas para a troca de líquidos. Além da terapia de substituição, é necessário uma terapia medicamentosa e o controle rigoroso em dietas adequadas ao perfil do paciente.12

O paciente renal crônico vivencia uma mudança súbita em sua vida devido às limitações da doença e o tratamento doloroso, como a hemodiálise, que podem levar a pensamentos sobre morte que intercalam com a possibilidade de realizar um transplante renal, criando expectativas e desilusões de melhorar a sua qualidade de vida.17

Além disso, acerca da contribuição da enfermagem nesse processo as opiniões são diversas. Alguns consideram que os profissionais de enfermagem não contribuem para que se torne mais fácil, outros consideram que sim ou que alguns contribuem.

Não [contribuem]. (L04)

Alguns [contribuem]. (L11)

Sim [contribuem]. (L09)

Sempre ajudam. (L16)

Se tiver alguma coisa me incomodando, eles me atendem. Graças a Deus eu não tenho o que dizer, daqui não. (L05)

Cerca de 19 pacientes alegaram que foram orientados acerca dos cuidados necessários com a fístula e/ou cateter.

Foi, eu fui bem orientado mesmo. (L16)

Esclareceram tudo direitinho. (L19)

Destes pacientes, 18 informaram que essas orientações foram suficientes e apenas um paciente utilizou de outros meios para obtenção de informação. A maioria dos pacientes utilizam a fístula para diálise.

Minha mulher pesquisou na internet e me disse o que tinha que fazer. (L11)

Embora os pacientes em maioria alegarem terem sido esclarecidos acerca dos cuidados necessários com a fístula, a baixa escolaridade destes pacientes pode interferir na compreensão destes cuidados e comprometer a realização de práticas adequadas.19 Portanto, a verificação constante do grau de conhecimento possibilita garantir que os pacientes sejam suficientemente informados e possam aderir aos cuidados necessários.

A pessoa com DRC, além da equipe de saúde, também é responsável pelo seu tratamento e precisa ser adequadamente orientada sobre autocuidado do acesso vascular na sua confecção e essas informações devem ser reforçadas durante o curso do seu tratamento.19

Percepção do paciente sobre a assistência de enfermagem durante o tratamento de hemodiálise

O Processo de Enfermagem (PE) consiste em um método assistencial que busca atender a essa proposta. Ele configura-se como um modelo de assistência, que auxilia na execução profissional da enfermagem, podendo ser composto por cinco etapas: coleta dos dados, Diagnóstico de Enfermagem (DE), planejamento do cuidado, implementação e avaliação. Na realização das terapias de renais substitutivas, o PE, através da etapa de estabelecimento dos DEs, constitui-se um mecanismo fundamental para orientar a realização do tratamento e buscar atender as necessidades individuais.14

Quase todos os pacientes declararam que os profissionais de enfermagem os acompanham durante todo o processo de diálise, apenas dois disseram que estes os acompanham de duas a três vezes ou não sabe dizer.

A diferença entre os participantes que referem conhecer os profissionais de enfermagem responsáveis pelo seu tratamento e os que conhecem apenas alguns é mínima.

Sim [conhece] e graças a Deus todas me atendem bem. (L05)

Essa aqui mesmo eu conheço, mas tem outras que não conheço, porque as vezes muda. (L11)

Identificada como melhor estratégia de cuidados, o cuidado centrado na pessoa prevê a integração de cuidados dos profissionais de saúde e paciente/familiar/cuidador voltados para as necessidades individuais de cada pessoa e contexto inserido, com respeito e dignidade, tornando-a o centro do cuidado, por meio de um vínculo e comunicação efetivos, em que o paciente é um sujeito ativo no seu processo de cuidados.22 A identificação dos profissionais de enfermagem para os pacientes como parceiros no cuidar da pessoa com doença renal crônica é fundamental para garantir uma assistência digna e humanizada.

A maioria diz que já tiveram complicações durante o procedimento e que os profissionais de enfermagem souberam conduzir a situação para sua estabilização hemodinâmica. Dentre as complicações relatadas estão: hipotensão, hipertensão, síncope, dores em membros inferiores, vômitos, hipoglicemia, tosse, taquicardia, infecção e parada cardíaca.

Sim, dores nas pernas e nos pés. Eles trouxeram aqueceram os meus pés. (L03)

Sempre tem, minha pressão baixa. Eles colocaram soro. (L07)

Já, já vomitei, desmaiei, já fiquei tonto [...], mas por minha culpa mesmo, eu sei que exagerei na comida, bebida. A gente se tiver problema aqui, eles resolvem. (L09)

O açúcar diminui, a pressão sobe. Conseguiram controlar. (L13)

Já porque eu sou diabético, aí sempre minha glicemia baixa. Eles me davam glicose. (L15)

Já tive umas duas vezes. Porque eu tive tosse, aí eles vieram aqui e ajustaram para melhorar. (L16)

A minha pressão baixa e agora no finalzinho da diálise, meu coração começa a bombar mais forte, aí elas diminuem o fluxo. (L19)

Já tive uma parada cardíaca aqui e me levaram para sala vermelha, quando eu acordei já estava lá na sala vermelha. Quando o cateter era no pescoço já inflamou, tive que tomar remédio já, antibiótico, umas duas, três vezes. A equipe ajuda sempre. (L20)

Uma parte considerável dos pacientes alegam que não tiveram nenhuma complicação na unidade de diálise ou que nunca tiveram complicações:

Não nessa unidade. (L01)

Nunca tive nada. (L14)

Durante o tratamento hemodialítico se observa com certa frequência sinais e sintomas como a alteração da pressão arterial (hipotensão ou hipertensão), cefaleia, náuseas e vômitos, síndrome de desequilíbrio, vasoconstrição, cãibras, prurido, e até dor torácica e lombar.14

Diante do complexo quadro clínico dos pacientes dialíticos, cabe ao profissional de saúde, incluindo o enfermeiro, identificar e tratar os fenômenos decorrentes da terapia hemodialítica, elaborando medidas estratégicas para a assistência, visando um acompanhamento holístico do paciente, em que todas as suas necessidades sejam supridas.14

Grande parte dos pacientes relatam que os profissionais de enfermagem sempre escutam suas necessidades e fazem orientações acerca do tratamento de diálise. Porém, alguns dizem que os profissionais escutam as necessidades, mas que não fazem orientações ou só fazem orientações se eles questionarem algo.

Não faz orientação não, só mexe na máquina mesmo. (L11)

Se pergunta, eles respondem. (L12)

Para alguns autores a comunicação é vista como um instrumento de cuidado, portanto cabe aos profissionais de saúde, principalmente a enfermagem, estabelecer relações com pacientes, famílias e cuidadores para compreensão de suas necessidades e esclarecimento de suas dúvidas.23 Além disso, é imprescindível um diálogo aberto com o paciente, para que este se sinta confortável em falar sobre suas expectativas, saber interpretar as suas demandas e de seus familiares de acordo com seus valores pessoais, culturais, e crenças e compreender o cuidador como um parceiro/auxiliar, envolvendo-os na assistência ao paciente.

Muitos pacientes declararam que os profissionais de enfermagem se demonstram empenhados para a melhoria de seus tratamentos, outros relatam que apenas alguns fazem isso.

Muito, muito, demais [sobre o empenho dos profissionais de enfermagem]. (L07)

Toda a assistência aqui é ótima. (L19)

Sempre ajudam a incentivar coisas boas, sempre, sempre. (L20)

Tem umas que não, mas tem umas que sim [sobre o empenho dos profissionais de enfermagem]. (L11)

Uma boa comunicação entre profissionais de saúde e pacientes pode ser significativa nos resultados dos cuidados ofertados, desde o esclarecimento sobre a sua questão de saúde até uma tomada de decisão que vai interferir no planejamento do seu cuidado, nos resultados clínicos e na sua percepção sobre a experiência vivenciada.23

Torna-se importante ressaltar a relevância dos profissionais de enfermagem no cuidado individual, assim como no planejamento adequado para a assistência, tendo em vista que a garantia da qualidade da atenção à saúde é possível se a assistência for realizada seguindo os critérios estabelecidos durante o planejamento de enfermagem.24-25

Um estudo realizado em um hospital universitário na Grécia em 2016 com pacientes em tratamento de hemodiálise relacionou principais temas de preocupação no cuidado da enfermagem ao paciente em hemodiálise, dentre eles estão o cuidado físico, apoio emocional/psicológico e educação em saúde. A pesquisa enfatiza que os pacientes dialíticos apresentam sofrimento emocional desde os primeiros estágios da doença, necessitando de uma boa comunicação nem sempre alcançada pela equipe de enfermagem.26

Somado a isso, a educação em saúde era negligenciada, cabendo ao paciente o esforço para adquirir o conhecimento necessário e o enfrentamento diário para se adequar ao tratamento.26 No presente estudo, a educação deficiente também pode acarretar sentimentos negativos com relação a doença e a enfermagem deve participar na mudança desse cenário. 

Quando questionados sobre a avaliação acerca da assistência de enfermagem na unidade de hemodiálise, a maioria diz ser excelente, dentre os principais motivos estão o bom relacionamento entre os profissionais e os pacientes, além da atenção ofertada durante o procedimento.

Porque eles têm cuidado e gostam da profissão. (L01)

Pelo apoio que eles dão. (L04)

Principalmente vindo das técnicas, todo mundo aqui trata a gente super bem. (L07)

Porque eu me sinto bem com a galera [o pessoal], isso é bom demais. (L09)

Teve um dia que cochilei aqui e aí vieram me perguntar 'Está tudo bem?'. (L10)

Pelo tratamento, porque se preocupa com seu bem-estar quando você vem aqui. (L16)

As meninas aqui me dão atenção, elas vêm quando chama, é excelente. (L19)

Alguns pacientes dizem que a assistência é boa, pois se sentem bem e acolhidos com o tratamento, entretanto acreditam que poderiam melhorar nas orientações acerca do tratamento:

Eles colocam a gente aqui na máquina, não tem como reclamar, todo mundo bem. (L03)

Porque me tratam bem. (L05)

Eu acho que se eu procurar orientação deles, eles me explicam, mas se eu não procurar, eles também não falam nada. Poderia melhorar. (L12)

Porque são tudo legal, educado, atencioso. (L17)

Porque pelo que eu vejo, pelo que eu observo, eu me sinto acolhida. (L18)

Outros que acham a assistência é regular, pois alegam que precisam melhorar:

Porque das três vezes que desmaiei aqui ninguém viu. (L02)

Porque precisa melhorar, né. (L11)

Deixam a desejar [são insuficientes], porque assunto de trabalho é de trabalho e assunto de casa é de casa. Tem que saber separar as coisas. (L13)

A DRC e a TRS podem levar a perdas e mudanças que acarretam alterações na integridade física e emocional tanto para o portador quanto para os familiares, as quais impactam na percepção do paciente sobre a sua experiência, portanto, uma assistência de qualidade é imprescindível para contribuir com a redução dos impactos causados.24-25

Quase todos os pacientes não quiseram acrescentar algo relacionado à assistência de enfermagem além das perguntas do formulário aplicado, apenas dois participantes quiseram apresentar outras opiniões. 

Às vezes demora um pouco para tirar a pressão, ver o açúcar, mas não tem como reclamar não, porque tem outros para atender. (L03)

É tanta coisa, a melhoria de tudo aqui dentro, eu acho que não é só atenção, é responsabilidade [...]. Tem que ser melhorado muita coisa aqui dentro, principalmente a assistência, médico, mais voltada para as pessoas que fazem diálise [...]. Eu estava falando esses dias, se tivesse uma reunião e tirasse um de cada grupo, ou dois, por exemplo: um paciente, um enfermeiro, um médico, um técnico, para encontrar uma melhoria, eles iam falar a parte deles e a gente ia falar o nosso. (L13)

Os serviços de saúde que atendem pacientes renais crônicos não se encontram devidamente preparados para uma assistência integral, humana e que possibilite uma experiência positiva e de qualidade. É necessário que os profissionais responsáveis pelos serviços reconheçam a realidade e as particularidades da DRC em seus pacientes, visando assegurar uma melhor qualidade do atendimento ofertado com a adequação dos procedimentos realizados, promovendo assim benefícios diretos para o portador e família.25

A narrativa de L13 revela uma necessidade que deve ser destacada: a possibilidade de realização de encontros entre os profissionais envolvidos no processo de hemodiálise e os pacientes, com a finalidade de discutir os pontos de melhoria. Este momento pode trazer benefícios a qualidade da assistência e permitir que as demandas dos pacientes sejam conhecidas, além de favorecer o fortalecimento do vínculo entre os envolvidos, quando esclarecidas as dificuldades de ambas as partes e o que pode ser feito para promoção de melhorias significativas, através de metodologias possibilitem aos envolvidos expressarem suas opiniões e discutirem de forma democrática.27-29

Um estudo realizado na Suíça com enfermeiros e pacientes de 10 clínicas de hemodiálise buscou comparar percepções deles em relação à assistência de enfermagem. Ambos percebem a assistência de enfermagem como de alta qualidade, com exceção da espiritualidade, o que pode ser justificado pela temática ser considerada delicada no país e particular de cada indivíduo, dificultando essa abordagem. A espiritualidade é uma dimensão importante para compreensão do paciente assistido para melhor atender suas necessidades e complexidades.30

Este estudo apresenta limitações com relação à espiritualidade dos participantes, não mencionada durante a pesquisa. Além disso, o estudo buscou apenas descrever o cenário a partir do olhar do paciente em tratamento de hemodiálise, não apresentando viés prático, tornando-se necessário novos estudos com aplicação de outras metodologias, como as rodas de conversa para paciente dialíticos, com o objetivo de analisar e buscar a melhoria do cenário apresentado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo demonstrou que muitos pacientes não conhecem sobre a doença e o tratamento, que estão realizando. Alguns pacientes realizam a hemodiálise sem saber exatamente o que têm ou para que serve este tratamento, levando a uma transferência de responsabilidade maior para os profissionais de saúde e de enfermagem.

Embora a maioria dos pacientes relatarem não ter dificuldades e uma fácil adesão à hemodiálise, essas informações são conflitantes com a compreensão deficiente deles acerca da doença e tratamento, o que dificulta para os indivíduos ter uma percepção clara do tratamento que estão recebendo.

A baixa escolaridade afeta consideravelmente a percepção do indivíduo sobre a doença, o que também ocorreu no estudo presente. Devida à dificuldade no entendimento das informações fornecidas associada à ausência de orientações pelos profissionais, essas desinformações se repetem.

Embora a maioria dos pacientes considerem a assistência de enfermagem na hemodiálise como excelente, existe uma deficiência que não pode ser desconsiderada na educação em saúde, a qual pode comprometer o tratamento e a percepção destes sobre o seu processo de saúde e doença, assim como a qualidade de suas vidas. O profissional de enfermagem, por ter também o papel de educador em saúde, deve se empenhar em garantir que os pacientes renais crônicos recebam o melhor esclarecimento sobre a doença e o seu tratamento.

Como recomendação, neste estudo se traz as rodas de conversa como uma estratégia relevante a ser considerada, por proporcionar encontros entre profissionais de saúde e pacientes para discussão de melhorias na assistência. Ademais, a roda de conversa também pode ser utilizada como proposta educativa, favorecendo o conhecimento e a promoção de melhoria no autocuidado da pessoa com DRC.

REFERÊNCIAS

1 Kidney Disease: Improving Global Outcomes (KDIGO) Diabetes Work Group. KDIGO 2020 Clinical Practice Guideline for Diabetes Management in Chronic Kidney Disease. Kidney Int. 2020;98(4S):S1-S115. DOI: https://doi.org/10.1016/j.kint.2020.06.019

2 Neves PDMM, Sesso RCC, Thomé FS, Lugon JR, Nasicmento MM. Censo Brasileiro de Diálise: análise de dados da década de 2009-2018. J. bras. nefrol. 2020;42(2):191-200. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/2175-8239-JBN-2019-0234

3 Thomas CV, Alchieri JC. Qualidade de vida, depressão e características de personalidade em pacientes submetidos à hemodiálise. Aval. psicol. 2005;4(1):57-64. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v4n1/v4n1a07.pdf

4 Castro RVR de S, Rocha RLP, Araujo BFM, Prado KF do, Carvalho TFS de. Chronic renal patient perception on experience in hemodialysis. Rev. enferm. Cent.-Oeste Min. 2018;8:e2487. DOI: https://doi.org/10.19175/recom.v8i0.2487

5 Cunha GLS, Alves TF, Quadros DCR, Giorgi MDM, de Paula DM. The person’s perception about its condition as a chronic renal patient in hemodialysis. Rev. Pesqui. (Univ. Fed. Estado Rio J., Online). 2021;12:636-41. DOI: https://doi.org/10.9789/2175-5361.rpcfo.v12.9086

6 Oliveira AC, Rocha ASC, Soares AHS, Alves AKS, Sousa CKL, Costa CBS, et al. O papel do enfermeiro no cuidado ao paciente em tratamento hemodialítico. Brazilian Journal of Surgery and Clinical Research. 2020;31(1):90-4. Disponível em: https://www.mastereditora.com.br/periodico/20200606_164826.pdf

7 Fontanella BJB, Ricas J, Turato ER. Amostragem por saturação em pesquisas qualitativas em saúde: contribuições teóricas. Cad. Saúde Pública (Online). 2008; 24(1):17-27. DOI: https://doi.org/10.1590/S0102-311X2008000100003

8 Sousa JR, Santos SCM. Análise de conteúdo em pesquisa qualitativa: modo de pensar e de fazer. Pesquisa e Debate em Educação. 2020;10(2):1396-41. DOI: https://doi.org/10.34019/2237-9444.2020.v10.31559

9 Oliveira LC, Lira GG, Fernandes FECV, Ornelas D, Mattos RM. Avaliação da adesão à hemodiálise pelo doente renal crônico. Enfermagem Brasil. 2020;19(5):372-80. DOI: https://doi.org/10.33233/eb.v19i5.3672

10 Piccin C, Girardon-Perlin NO, Coppetti LC, Cruz TH, Beuter M, Burg G. Sociodemographic and clinical profile of chronic kidney patients in hemodialysis. Rev. enferm. UFPE on line. 2018;12(12):3212-20. DOI: http://dx.doi.org/10.5205/1981-8963-v12i12a234669p3212-3220-2018

11 Marinho CLA, Oliveira JF, Borges JES, Silva RS, Fernandes FECV. Quality of life of chronic renal patients undergoing hemodialysis. Rev Rene (Online). 2017;18(3):396-403. DOI: https://doi.org/10.15253/2175-6783.2017000300016

12 Cruz VFES, Tagliamento G, Wanderbroocke AC. A manutenção da vida laboral por doentes renais crônicos em tratamento de hemodiálise: uma análise dos significados do trabalho. Saúde Soc. 2016;25(4):1050-63. DOI: https://doi.org/10.1590/S0104-12902016155525

13 Jesus NM, Souza GF, Mendes-Rodrigues C, Neto OPA, Rodrigues DDM, Cunha CM. Quality of life of individuals with chronic kidney disease on dialysis. J. bras. nefrol. 2019;41(3):364-74. DOI: https://doi.org/10.1590/2175-8239-JBN-2018-0152

14 Debone MC, Pedruncci ESN, Candido MCP, Marques S, Kusumota L. Nursing diagnosis in older adults with chronic kidney disease on hemodialysis. Rev. bras. enferm. 2017;70(4):800-5. DOI: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0117

15 Gesualdo GD, Menezes LC, Rusa SG, Napoleão AA, Figueiredo RM, Melhado VR et al. Factors associated with the quality of life of patients undergoing hemodialysis. Texto & contexto enferm. 2017;26(2):e05600015. DOI: https://doi.org/10.1590/0104-07072017005600015

16 Clementino DC, Souza AMQ, Barros DCC, Carvalho DMA, Santos CR, Fraga SNF. Hemodialysis patients: the importance of self-care with the arteriovenous fistula. Rev. enferm. UFPE on line. 2018;12(7):1841-52. DOI: http://dx.doi.org/10.5205/1981-8963-v12i7a234970p1841-1852-2018

17 Barata NERRC. Dyadic relationship and quality of life patients with chronic kidney disease. J. bras. nefrol. 2015;37(3):315-22. DOI: https://doi.org/10.5935/0101-2800.20150051

18 Schwanke AA, Danski MTR, Pontes L, Kusma SZ, Lind J. Central venous catheter for hemodialysis: incidence of infection and risk factors. Rev. bras. enferm. 2018;71(3):1115-21. DOI: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0047

19 Santana NF, Nobre VNN, Luz LKT. Autocuidado com fístula arteriovenosa em terapia renal substitutiva. Revista científica de enfermagem. 2019;9(26):60-7. DOI: http://dx.doi.org/10.24276/rrecien2358-3088.2019.9.26.60-67

20 Cruz MRF, Salimena AMO, Souza IEO, Melo MCSC. Discovery of chronic kidney disease and everyday of hemodialysis. Ciênc. cuid. saúde. 2016;15(1):36-43. DOI: https://doi.org/10.4025/ciencuidsaude.v15i1.25399

21 Amorim LKA, Souza NVDO, Pires AS, Ferreira ES, Souza MB, Vonk ACRP. The nurse’s role: recognition and professional appreciation in the user’s view. Rev. enferm. UFPE on line. 2017;11(5):1918-25. Available from: https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistaenfermagem/article/view/23341/18945

22 Rodrigues JLSQ, Portela MC, Malik AM. Agenda for patient-centered care research in Brazil. Cien Saude Colet. 2019;24(11):4263-75. DOI: https://doi.org/10.1590/1413-812320182411.04182018

23 Silva GL, Lemos KCR, Barbosa AO, Santos GMR. Perception of chronic kidney patients undergoing hemodialysis, about kidney transplantation. Rev. enferm. UFPE on line. 2022;14:e244498. Available from: https://doi.org/10.5205/1981-8963.2020.244498

24 Ottaviani AC, Betoni LC, Pavarini SCI, Say KG, Zazzetta MS, Orlandi FS. Association between anxiety and depression and quality of life of chronic renal patients on hemodialysis. Texto & contexto enferm. 2016;25(3):e00650015. DOI: https://doi.org/10.1590/0104-07072016000650015

25 Araújo RCS, Silva RAR, Araújo AEV, Bezerra MX, Onofre MS, Silva KMP. Therapeutic itinerary of patients with chronic renal failure under dialytic treatment. Rev. Pesqui. (Univ. Fed. Estado Rio J., Online). 2014;6(2):525-38. DOI: https://doi.org/10.9789/2175-5361.2014.v6i2.525-538

26 Delmas P, Antonini M, Berthoud L, O’Reilly L, Cara C, Brousseau S, et al. A comparative descriptive analysis of perceived quality of caring attitudes and behaviours between haemodialysis patients and their nurses. Nursing Open. 2020;7:563–570. DOI:https://doi.org/10.1002/nop2.42

27 Dias ESM, Rodrigues ILA, Miranda HR, Corrêa JA. Conversation wheel as education strategy in health for nursing. Rev. Pesqui. (Univ. Fed. Estado Rio J., Online). 2018;10(2):379-84. DOI: https://doi.org/10.9789/2175-5361.2018.v10i2.379-384

28 Silva KMM, Vasconcelos VO. As rodas de conversa como instrumento metodológico na educação de jovens e adultos. EJA em Debate. 2019;8(13):1-11. Disponível em: https://periodicos.ifsc.edu.br/index.php/EJA/article/view/2557

29 Adamy EK, Zocche DAA, Vendruscolo C, Santos JLG, Almeida MA. Validation in grounded theory: conversation circles as a methodological strategy. Rev. bras. enferm. 2018;71(6):3121-6. DOI: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2017-0488

30 Stavropoulou A, Grammatikopoulou MG, Rovithis M, Kyriakidi K, Pylarinou A, Markaki AG. Through the Patients’ Eyes: The Experience of End-Stage Renal Disease Patients Concerning the Provided Nursing Care. Healthcare. 2017;5(3):36. DOI: https://doi.org/10.3390/healthcare5030036

Recebido em: 23/10/2021

Aceito em: 26/10/2022

Publicado em: 21/12/2022



[1] Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública (EBMSP). Salvador, Bahia (BA). Brasil (BR). E-mail: laracunha29@gmail.com ORCID: 0000-0002-8957-5120

[2] Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública (EBMSP). Salvador, Bahia (BA). Brasil (BR). E-mail:marilaine.menezes@hotmail.com ORCID: 0000-0002-0562-5523

 

Como citar: Pereira LTC, Ferreira MMM. Percepções de pacientes com doença renal crônica sobre tratamento de hemodiálise e assistência de enfermagem. J. nurs. health. 2022;12(2):e2212221884. Disponível em: https://revistas.ufpel.edu.br/index.php/JONAH/article/view/4424