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A origem dos museus no Ocidente deixou como legado os rastros de uma epistemologia da colonialidade. Os processos de colecionamento, os regimes de valoração, a classificação taxonômica e os processos comunicativos revelam não apenas a vontade de deslocar e reenquadrar objetos e patrimônios, mas, sobretudo, o intento de domesticar culturas. A emergência dos estudos culturais, do pensamento pós-colonial e, na América Latina, do giro decolonial, trouxe à cena posturas críticas sobre a constituição de subalternidades nesses espaços e processos, o que tem estimulado uma profunda revisão dos campos museológico e patrimonial. O processo de descolonização em curso, em suas dimensões epistêmicas e práticas, pode ter como ponto de inflexão os seguintes questionamentos: como essas “coisas” vieram parar nos museus ou foram institucionalizadas como patrimônios? De quem são essas “coisas”? Quem opera sobre os discursos e os processos de musealização/patrimonialização? Qual é o destino esperado para essas “coisas” e quem se beneficia com isso? Repensar os museus e os patrimônios de uma mirada decolonial é um empreendimento complexo; requer desafiar não apenas os regimes de colonialidade que os formataram, mas, igualmente, reimaginar os papéis e propósitos dessas instituições no contemporâneo, na teoria e na prática. Este dossiê tem como propósito reunir artigos que reflitam sobre os desafios éticos, políticos, epistêmicos e práticos que emergem desses processos de desenquadramento e reenquadramento. Estão no cerne desta proposta discussões que tratam de práticas museológicas e patrimoniais colaborativas, de construção de narrativas históricas contra-hegemônicas, de abordagens que consideram as perspectivas nativas de museu e patrimônio, de políticas de restituição e repatriação, de processos que envolvam a reparação de memórias subalternizadas, de intervenções antirracistas, antiLGBTfóbicas, anticapacitistas e feministas, dentre outros temas análogos.