Ações afirmativas e ingresso no ensino superior brasileiro: um breve panorama
Resumo
Parte da discussão sobre ações afirmativas nasce da reflexão sobre mecanismos que podem ser criados para proporcionar remédios às desigualdades. Assim, apesar da origem estadunidense, o tema foi reivindicado no Brasil, especialmente a partir do contexto de redemocratização. Daquele momento em diante, sobretudo com base na Constituição de 1988 e pelo destaque que a Conferência de Durban deu ao tema anos depois, as ações afirmativas começaram a ser formuladas e implementadas voluntariamente em universidades públicas brasileiras. Levando em consideração esse contexto, o objetivo deste estudo é traçar um panorama do debate sobre ações afirmativas e ingresso no ensino superior brasileiro. Para isso, este artigo está dividido em três subseções: a primeira busca apresentar a origem das ações afirmativas e sua relação com o contexto brasileiro; a segunda foca em abordar o desenvolvimento das ações afirmativas no ensino superior, o debate na mídia e os casos UERJ e UnB; por fim, a terceira traça uma discussão acerca de alguns pontos controversos sobre a política de cotas, como o caso das comissões de heteroidentificação, e de quais são os sujeitos de direito dessa política. Por fim, defende-se a necessidade de ampliação da política como parte das perspectivas futuras.Downloads
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